A Volta do Rei Leão: um enredo truncado, visual muito confuso e coreografia primária

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 11.05.1997

 

 

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Na contramão do teatro que é teatro

Os arqueólogos do teatro por certo já fizeram um estudo, pelo menos por títulos, das tendências que marcaram cada década. Numa volta no tempo, à época em que as revistas da Sociedade Brasileira de Autores (SBAT) publicavam todas as peças em cartaz na temporada, é interessante notar que nos anos 70/80, salvo raríssimas e honrosas exceções, o mundo era da bicharada. Entre os mais notáveis, algo do gênero O Coelho Esperto ou O Coelhinho Sabido, que só não eram mais sabidos e espertos do que os produtores que armavam essas arapucas teatrais.

No começo dos anos 90, correndo paralelo ao teatro de boa qualidade que estava em cena, ainda se podia achar um bom três em um nos títulos. Isto é, aproveitando um personagem de sucesso, da TV ou do cinema, passeava por nossos palcos um Emília e Chapeuzinho Vermelho na Floresta do He Man ou algo bem parecido. A história é verídica. E o jornal, um documento de “cunho probatório”, pode confirmar.

Com o tempo, essas preciosidades deixaram de ter espaços na mídia. Mas não se enganem, elas não saíram de cartaz. Aliás, preferem ficar no anonimato. Com ingressos bem mais baratos e procurados nos teatros que convencionalmente apresentam esse tipo de produção, as Onças e os Bodes são ainda as pièces de resistance do teatro que não vai ao teatro.

A Volta do Rei Leão, com texto e direção de Maria Cristina Furtado, em cartaz no Teatro Cândido Mendes, ainda que superior a seus companheiros de palco acima citados, é também um teatro que há muito não vai ao teatro. Sua estrutura antiga, apelando para o que se convencionou chamar de participação do público, seus personagens de características óbvias e seu enredo pouco criativo trazem de volta à cena tudo aquilo que os novos encenadores tentam arduamente modificar.

A história começa, não se sabe muito bem porque, com o tigre no comando da Floresta do Amor. Os bichos, revoltados, são convocados pela raposa e pelo alce para destronar o rei. Na floresta, que de pacífica só tem o nome, os bichos chegam a conclusão de que devem trucidar o tigre. Só não o fazem porque são poucos. Assim, ao invés de matar o inimigo, apelam para uma estratégia mais amena: espalham pela mata que o rei leão está voltando com um exercito exterminador, capaz de arrasar o tigre e seu bando, que, aliás, é composto, ao todo, por uma hiena, que a ele se refere como “poderoso e vitaminado”, adjetivo que deve ser muito comum entre as crianças. Entre intrigas e espertezas o rei leão volta ao trono embalado por música e coreografia que dão o espetáculo por encerrado pelo menos umas três vezes.

Maria Cristina Furtado, que escreveu o livro Viva a Liberdade inspirada no seu texto teatral A Volta do Rei Leão, foi mais feliz no livro. Lá, pelo menos, a trama tem melhor encadeamento. Não seria o caso de rever essa história?

Além do enredo truncado, o espetáculo tem apelo visual confuso, com personagens de difícil caracterização, coreografia primária e trilha musical inaudível, com exceção do hit A Pantera Cor de Rosa, sublinhado pela iluminação na mesma cor. Não precisava tanto.

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