Crítica publicada no Site da Revista Crescer
Por Dib Carneiro Neto – São Paulo – 01.09.2017
O valor de se debochar dos contos de fadas
Cia. Auspiciosa trata o tema da homoafetividade com bom gosto e humor inteligente
Sabe daquelas peças para crianças em que os jovens e adultos também são contemplados e todo mundo se diverte junto? Pois assim é a hilária A Princesa Errante e o Príncipe Errado, da Cia. Auspiciosa. Trata-se de uma paródia das histórias clássicas de princesas, com belo texto de Ana Roxo, às vezes prosa poética, às vezes teatro narrativo, outras vezes puro deboche. É certeza de diversão.
“Era uma vez um príncipe eu se sentia errado e uma princesa que queria ser errante.” Assim a companhia começa a explicar o enredo da peça no material de divulgação. O sensível príncipe (Cristiano Meirelles) só queria brincar com coisas de menina. A sapeca princesa (Ana Roxo) tinha um fogo de aventureira pé na estrada, característica mais associada, nos contos de fadas, aos personagens masculinos. O ‘destino’ vai fazer seus caminhos se cruzarem. Muita diversão rola no palco até que o garoto consiga literalmente sair de dentro de um armário e ouvir do rei, seu pai, que o havia trancado ali: “Eu o amo como você é.”
Um espetáculo diferentão, atual, frenético, necessário, delicadamente militante. Ótimas canções são executadas ao vivo, graças aos múltiplos talentos musicais de Cristiano Meirelles. A peça começa, porém, em outro clima: com um lindo poema do português Fernando Pessoa (1888-1935), dito pelo casal de protagonistas. O poema é bem conhecido, Eros e Psique. Bela cena.
Mas o destaque é mesmo o humor. Inteligente, certeiro. Dramaturgicamente muito bem explorado. Quando a atriz diz “culhão”, ela se vira para a plateia e comenta: “Pais, depois vocês explicam em casa o que é culhão, ok?” Quando o ator faz papel de Branca de Neve, sem ter a pele branquinha da personagem, a plateia também é brindada com um comentário hilário, ironizando a patrulha da ‘representatividade’ e do politicamente correto.
Ao final, uma eficientíssima cena musical sobre os paradigmas de felicidade pede a participação da plateia. Para completar a letra da canção, o público tem de dizer aos atores coisas que desejariam que fizesse parte de um provável paraíso. Na sessão em que estive, as pessoas disseram coisas como: uma cascata só de cerveja, os rios limpos, uma montanha de brigadeiros, festa todo dia, justiça social.
Tudo é de bom gosto. Mostra como é possível debochar sem agredir. Um espetáculo vivo, alto astral. Auspicioso como o nome do grupo. Para não perder. Com toda a família.
Serviço
Centro da Terra
Rua Piracuama, 19 – Sumaré – São Paulo
Telefone: (11) 3675-1595
Capacidade: 100 pessoas
Domingos, às 11h.
Duração: 55 minutos
Classificação: livre. Ingressos: R$ 30,00 (inteira) e R$ 15,00 (meia)
Vendas online: www.centrodaterra.com.br
Temporada: De 20 de agosto a 24 de setembro de 2017