O menino (Oberdan Júnior) e seu universo encantado

Instante de O Ouro das Estrelas, a aventura do menino que se sente sufocado em casa e se refugia em sua imaginação

Crítica Publicada no O Globo
Por Rita Kaufman – Rio de Janeiro – 18.04.1986

Feitiço da TV em O Ouro das Estrelas

Um texto moderno, que trata de fatos relacionados com o comportamento da criança hoje, é o que promete Tonio Carvalho, integrante do grupo Teatro Feliz-Meu-Bem e autor de O Ouro das Estrelas, peça que estreia amanhã no Teatro Villa-Lobos. Colecionador de prêmios nos concursos de dramaturgia e troféus Mambembe na categoria de autor – As Três Luas de Junho, Histórias de A-Ayá, O Mistério do Boi Surubim, O Pequeno Circo dos Pequenos, A Idade dos Sonhos – Tonio Carvalho considera O Ouro das Estrelas seu primeiro texto “contemporâneo” e comenta:

– Até o Ouro considero meus textos passadistas, nostálgicos, melancólicos. A partir dessa peça, entrei na fase solar, diurna, voltada para a criança de hoje e não para a criança que nós no Feliz-Meu -Bem já fomos. As referências são atuais, nada de ciganos. O Ouro das Estrelas conta uma aventura terrestre, envolvendo o feitiço da televisão e seus seriados de ficção.

Na bagagem das realizações do Feliz-Meu-Bem, em seis anos de atividades intensas, além das mencionadas, está As Sete Quedas do Meu Pobre Coração. A Idade do Sonho, realização do ano passado, e um dos cinco melhores espetáculos do ano (Prêmio INACEN), é uma das mais cotadas, nas diversas categorias candidatas ao Troféu Mambembe. Inclusive a de “revelação”, para o diretor, Vicente Maiolino, que volta à função em O Ouro, e declara:

– As realizações anteriores do Feliz Meu Bem sempre foram puxadas para o barroco. Agora, no Villa-Lobos, que tem um palco grande, estamos utilizando o palco aberto como um amplo cenário, quase oriental. Continuo preocupado com a estética do espetáculo (Maiolino é, originalmente, cenógrafo, figurinista e aderecista), que a gente poderia chamar de espacial. Fiz uma pesquisa sobre o uso de objetos no teatro japonês e estamos utilizando uma cenografia móvel, bem brasileira, com piões, balões.

O mito da eternidade, dos ciclos da vida (infância-velhice) e os movimentos dos astros foram fatores de influência na concepção de Vicente Maiolino para a movimentação cênica dos atores. E a história de um menino sufocado pela rigidez das regras familiares, mas que encontra refúgio na aventura da imaginação. A base da fantasia do menino, como ele é chamado durante a peça, é o seriado da televisão O Ouro das Estrelas e, um dia, ele adormece misturando realidade e ficção, indo parar numa “ilha tropical espacial”.

Assegurando que O Ouro das Estrelas não é uma peça maniqueísta, já que a representação do Mal “é bonita e gostável” e que o Bem tem bem definido seu lado maldoso, Vicente Maiolino e Tonio Carvalho buscam em seu espetáculo o equilíbrio, seja das energias cósmicas, da cor, da forma, da plasticidade.

Protagonizando o menino de 12 anos, um jovem experiente ator volta aos palcos, após uma ausência de quase dois anos. É Oberdan Júnior que como Tistu-o O Menino do Dedo Verde mobilizou uma multidão de gatinhas em torno do mesmo Teatro Villa-Lobos, onde a peça esteve em cartaz em 1983. Aos 15 anos, Oberdan se prepara para fazer o vestibular para a Faculdade de Teatro e sua última realização em televisão foi ano passado, na novela A Gata Comeu, da TV Globo. No momento, está lendo Drogas, de Chico Júnior.

As irmãs Patrícia e Raquel Durães que, desde A Idade do Sonho trabalham a música das peças do Feliz Meu Bem, desta vez tiveram um trabalho diferente dos anteriores. Raquel, pianista, compõe e Patrícia, flautista, coloca as composições de acordo com a concepção do espetáculo. Acostumadas a trabalhar com som acústico, as irmãs foram forçadas a incluir Maurício Gaetani em sua dupla, para poderem trabalhar com os instrumentos eletrônicos que a aventura da Idade pede. Explica Patrícia Durães: Fizemos muitos efeitos sonoros inspirados em filmes espaciais. Ao contrário de A Idade do Sonho, cuja música era toda ao vivo, no Ouro a trilha é toda gravada. A abertura do seriado da televisão, por exemplo, é marcada por música bem cinematográfica, com muitos tímpanos e bateria.