Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone, Rio de Janeiro – 10.09.1991

Barra

Uma trama que garante a diversão.

Existem chuvas e chuvas. As de Ranchipur foram um sucesso para Lana Turner, as de Singing in the Rain valeram a Gene Kelly uma das sequências musicais mais incluídas na lista dos cults. Já as de 1965 foram literalmente um desastre para o Rio de Janeiro de Negrão de Lima. Erundina em São Paulo quando vê cair o primeiro pingo grita: “É o estado!” Ao que este responde: “É a prefeitura!”

Malu Macedo, premiada diretora, com dez anos dedicados ao público infantil, também está tendo os seus problemas com o dilúvio. O Embarque de Noé chega ao Tereza Rachel com vários acidentes de percurso. Sem nenhum apoio financeiro, a Cia. De Oz entra em cena contando apenas com o esforço de seus componentes que se desdobram nas mais diversas funções para colocar o espetáculo no palco.

Um texto de Maria Clara machado é sempre bem vindo. Montado em 1973, no Tablado, O Embarque de Noé chega nos anos 90 com um toque de modernidade dado por Malu Macedo em sua trilha sonora, que mistura Strauss e Vangelis com Richard Clayderman e Rick Wakeman, e na delicada direção dos vinte atores e não atores que estão em cena.

Segurar essa trupe num espetáculo de uma hora e meia ´tarefa hercúlea. A direção, ao mesmo tempo em que proporciona a platéia cenas de extremo lirismo, como a da Senhora Noé (Eliana Ovalle) realizando o simbólico casamento de seus três filhos com as suas companheiras, ou a do emocionante encontro do solitário Pingüim (Sérgio Rodrigo) com sua graciosa partner, a Pingüim Karine Moura, deixa escapar o over acting do casal de Protozimbos Pintados (Marcelo Torreão e Denise Catilina).

A comicidade do espetáculo fica por conta do Can de Marco Rodrigo, garoto esperto, cheio de ginga, que dá as suas cenas um toque especial de humor, cativando o público infantil, que se identifica com sua postura irreverente e com a alegria da bicharada do Amlid Jazz Dance, onde se destaca a engraçadíssima macaquinha. “Enxugar” esse dilúvio, no entanto, é necessário e desejável. Isso pode ser feito, por exemplo, sincronizando a sonoplastia de algumas cenas que se perdem no diálogo do homem com a máquina, no caso a do Sr. Noé com o operador de som, totalmente comprometida, e no ajuste do ritmo de certas passagens que se tornam longas e arrastadas.

Apesar dos contratempos, a arca flutua. O Embarque de Noé é um espetáculo que diverte sua platéia, envolvendo o público infantil não só pelo enredo do texto, já que este participa ativamente da trama, denunciando esconderijos e adorando os raios e trovões que iluminam o céu do Teatro.

Cotação: 2 estrelas ( bom )