Anne Margaride é Flor de Liz (D) e Fernanda Nobre, a Fada: preocupações com o planeta.
Foto Sérgio Cabral

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 19.04.1997

 

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Falta cortar excessos e afinar o espetáculo

Não se sabe muito bem o que leva autores tão distantes do universo infantil a ter plena certeza de que é muito mais fácil escrever uma peça para crianças. O desgastado chavão de apelar “a criança que ainda existe em nós” tem trazido ao palco atrocidades. A Mágica Fábrica de Brinquedos é uma delas.

O texto de Lúcia Nogueira, supostamente uma fábula bem-humorada, chega à encenação num mix de teatro contestação dos anos 60, quando se sonhava com “canhões que explodissem purpurina”, e o que se imagina ser a novíssima gíria dos anos 90, além de alguns toques de humor apelativo. Estes só poderiam existir como cacos, mas infelizmente fazem parte do texto. Enfim, confirma-se que o pior improviso é o ensaiado.

A história, desenhada em 15 cenas quilométricas, é sobre a menina Flor de Liz. Triste com a destruição do planeta, ela pede de aniversário a Nicolau, um velhinho que mora na Lapônia, que “os generais se transformem em jardineiros” e que “as bombas sejam de chocolates”. Numa trama confusa, a peça é dividida em três planos: a oficina de Nicolau, a casa da menina e um plano neutro para a aparição da bruxa Cinzenta, um personagem que exige dos ajudantes, a cada diálogo, adjetivos como fabulosa, maravilhosa e vitaminada.

Mas Cinzenta não é sempre tão informal. Quando convence seus duendes a espionar a fábrica de brinquedos, dá as diretrizes da ação em outro tom: “Use toda a sua capacidade de interpretar a humanidade, com perspicácia, ironia. Finja que é sentimental, crie uma relação com Nicolau. Descubra se ele vai tentar realizar o sonho da Florzinha e como se processa a magia dele…”. No palco, como na vida, os que falam como escrevem terão, fatalmente, seus problemas de comunicação.

Don Carrera, diretor do espetáculo, não é um profissional iniciante nem está sob a maldição da segunda peça. São deles o bem-sucedido Apenas um Conto de Fadas, de Eduardo Tolentino, que ficou três anos em cartaz, e a muito bem produzidas Alegres Comadres, versão das comadres de Shakespeare adaptada para crianças por Paulo Afonso de Lima. Assim, é incompreensível que se tenha deixado seduzir por material tão aquém de suas produções anteriores.

Mesmo com todos os obstáculos que o espetáculo enfrenta, é de impressionante qualidade a atuação do jovem ator Sérgio Hondjakoff, no papel do cachorro Desastrado. O menino se sai muito bem das armadilhas pregadas pelo imenso texto, muitas vezes situações repetitivas que tem de decorar. É o único em cena a ter alguma empatia com a plateia. Mas isso ainda é pouco para resolver todos os problemas da encenação. Espera-se que Don Carrera volte ao palco para cortar os excessos do texto e finalmente afinar o espetáculo.

Cotação: 1 estrela (Regular)