Crítica publicada no Site da Revista Crescer
Por Dib Carneiro Neto – São Paulo – 04.10.2013

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Ciência, uma brincadeira ao alcance de todos

No espetáculo Experiência, inusitado e ousado, o que menos vale é a fábula linear

Com o subtítulo “Eu queria que fosse: ‘era uma vez Frankenstein’… mas não foi. E viveram felizes para sempre”, este movimentado espetáculo – idealizado pelo ator Thiago Amoral – brinca com conceitos básicos da ciência. Os personagens são cientistas bem maluquinhos e surreais, que resolvem apresentar ao mundo um experimento que, segundo eles, pode transformar a evolução da espécie humana. O roteiro é bem lúdico e usa jogos de palavras, dança, teatro, vídeo e até a música de Mozart, para revelar os instintos animais que moram dentro de nós, ou seja, para provar que não há tanta distância assim entre a natureza humana e o reino animal. Afinal, como diz o texto, somos vários: leves como borboleta, lerdos como lesma, curiosos como curiós, dorminhocos como bichos preguiças e assim por diante.

O nome do espetáculo – ideal para aquelas crianças que adoram aprender e vivem perguntando tudo sobre os conceitos do mundo – não poderia ser mais apropriado, Experiência. Trata-se de uma ousada ‘experiência’ dramatúrgica, em que a linearidade da história não importa nem um pouco. Existe até certa circularidade no texto, que vai e volta,propositadamente repetitivo, com as palavras e situações nos enredando de forma muitas vezes confusa e sempre intrigante.

Há muitas citações durante o espetáculo, não só de conceitos ligados à ciência e à vida, como a pessoas ilustres e geniais, como Goethe, Einstein e até Gabriel García Márquez. Isso tudo vai se amontoando na nossa frente, diante de nossos olhos, sem a preocupação em formar um espetáculo didático e claro. Não se explica tudo, ou melhor, não se explica quase nada. O que vale é mais a fruição da experiência do que a compreensão de uma fábula linear. Por incrível que pareça, essa é uma proposta que sempre assusta mais os adultos do que as crianças. Ficamos querendo explicações para tudo, incomodados com a falta de começo-meio-fim, enquanto nossos filhos embarcam na brincadeira como se participassem de uma festa dos sentidos, uma farra de sensações. Foi o que observei na plateia do Sesc Pompeia, no sábado passado.

Na safa direção geral disso tudo está Cristiane Paoli Quito, paulistana que há anos estuda as múltiplas possibilidades de improvisação na linguagem cênica e já foi ganhadora de prêmios teatrais como Shell, APCA e Femsa, por peças como Caminhos (2007), Buuu!!! A Casa do Bichão (2008), Coppélias?! (2009), O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá (2011), O Samba (2012) e Meu Pai É um Homem Pássaro (2012). Ela também assina concepção e roteiro. O texto foi criada por ela e pelo elenco.

A direção de atores é sensacional. Cada um dos quatro personagens, por exemplo, tem um jeito diferente de andar e gesticular, um jeito coreografado de se expressar, como se tivessem saltado de um desenho animado. É isso que nos dá a exata medida do quanto toda essa experimentação aparente não é aleatória, ao contrário, é pensada, estudada e executada com um nível grande de detalhes. São interpretações absolutamente construídas e coreografadas, mas que nos transmitem uma ilusão de improviso. Os atores são: Fabricio Licursi (como Dr. Papillon de Albuquerque), Fernanda Castelo Branco (como Dra. Suzana Taboada), Leonardo Crochik (como Dr. Físico Crochik) e Thiago Amoral (como Dr. Alfred Gastão Amoral).

Adoro a cena da borboleta. Plasticamente, é uma das cenas mais lindas que vi no teatro infantil nos últimos tempos, realizada com suporte da projeção de vídeo. Também vale a pena ficar atento à construção lúdica e poética da linguagem utilizada. O tatu-bola, por exemplo, nos despeja um texto brincalhão e sonoro, como: “tatu-bola, tá tudo bem?, tá tudo bola?” É um requinte verbal, disfarçado de simplicidade.

O laboratório dos cientistas, criado pela cenografia de Marisa Bentivegna, é muito criativo, sobretudo pelo auxílio do desenho de luz (a cargo da mesma Marisa Bentivegna). Temos direito até a alguns ‘efeitos especiais’, como ver uma enorme baleia de isopor simplesmente derreter no palco, à vista do público. Na trilha sonora, de Mariá Portugal, a genial musicalidade da obra de Wolfgang Amadeus Mozart casa à perfeição com o ritmo de cada cena, como uma cereja no bolo.

Serviço

SESC Pompeia
Rua Clélia, 93
Telefone (11) 3871-7700
Sábados e domingos, às 12h
Sessões extras: Dias 12 e 13 de outubro, sábado e domingo, 16h e dia 20 de outubro, domingo, 16h
Obs: Dias 26 e 27 de outubro não haverá espetáculo
Ingressos: R$ 8,00 (inteira); R$ 4,00 (usuário matriculado no SESC e dependentes, +60 anos, estudantes e professores da rede pública de ensino) e R$ 1,60 (trabalhador no comércio e serviços matriculado no SESC e dependentes)
Até 03 de novembro