Crítica publicada no Site da Revista Crescer
Por Dib Carneiro Neto – São Paulo – 23.08.2013

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A graça e a técnica do teatro de objetos

Com pleno domínio da arte de dar vida a formas inanimadas, Circo de Coisas encanta o público de todas as idades

A modalidade de teatro de objetos ou de formas inanimadas felizmente já tem grandes representantes no circuito paulistano. Um deles é Claudio Saltini e sua trupe Circo de Bonecos. Ao longo dessa primeira década dos anos 2000, eles já nos encantaram com Circus – A Nova Turnê, Lolo BarnabéO VooInzooniaGuarda ZoolCirco de Bonecos (sim, o mesmo nome da cia.) e o premiadíssimo Circo de Pulgas.

A novidade desta vez se chama Circo de Coisas, espetáculo em cartaz na sala B do Teatro Alfa. Mais do mesmo? De certa forma, sim. Mas se esse mesmo é o máximo, por que não? Saltini, melhor ator em 2010 por Circo de Pulgas, continua imbatível em cena. Seu gestual, sua expressão corporal, os olhares, as caretas, enfim, o jeitão, a poesia e a filosofia de um clown conseguem na pele de Claudio Saltini sua mais perfeita tradução. Ele é um craque impagável nessa arte.

Desta vez, seu parceiro em cena é Sandro Gattone, também esbanjando graça e técnica. Um pregador de roupas vira equilibrista na corda bamba, uma rolha de champanhe é o homem-bala, um processador de alimentos se adequa à figura do mágico, ovos e rolhas são acrobatas e assim por diante: os objetos, desta vez, se transformam em artistas de circo!

Mas nada é óbvio. O elemento surpresa é fundamental nesse tipo de espetáculo. Assim, os ovos são ovos crus, mesmo, e se espatifam várias vezes no chão do palco, para mostrar que os acrobatas sofrem acidentes e morrem em cena. Os dois atores-manipuladores, compungidos, promovem até os “enterros” dos acrobatas, com o gesto divertido e simbólico de fazer um balão de gás subir na direção do céu.

Os números coreografados são ótimos. Saltini e Gattone ficam divertidíssimos tentando acertar os passos, com o auxílio de uma trilha sonora sempre muito adequada e bem escolhida. Preste atenção na hilariante cena de striptease de uma banana, ao som da clássica “Je t’ Aime, Mois Non Plus”. Os figurinos são clássicos, vistosos e bem elegantes, com destaque para a criatividade dos sapatos. A duração do espetáculo é acertadamente curtíssima, com menos de uma hora – como tudo é dividido em esquetes circenses, anunciadas por placas/cartazes, se fosse um espetáculo mais longo, essa repetição esquemática poderia cansar.

No caprichado programa de Circo de Coisas, duas frases de pensadores célebres explicam a importância de se redistribuírem significados e significantes a objetos corriqueiros do nosso cotidiano: “A imaginação é a faculdade de formar imagens que ultrapassam a realidade (Gaston Bachelard)” e “O significado das coisas não reside nas próprias coisas, mas na nossa atitude relativamente a elas (Antoine de Saint-Exupéry)”. Diante disso, linda e tocante é a cena dos aplausos finais, em que os dois atores de carne e osso pedem palmas para todos os objetos utilizados, um a um, como se trenas, ovos, rolhas e garrafas fossem artistas reverenciando o público com gestos de cabeça. Mas, nesse caso, quem disse que não são? Vamos lá aplaudir?

Serviço

Teatro Alfa – Sala B
Rua Bento Branco de Andrade Filho, 722 – Santo Amaro
Tel. (11) 5693-4000
Sábados e domingos, às 16h
Ingressos a R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia)
Até 22 de setembro