O elenco jovem, em determinados momentos, superatua e, em outros, se envolve em cacos musicais que são uma atrocidade


Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 13.02.1997

 

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Montagem desperdiça bom texto

Alguns estilos de representação, mesmo que tenham alcançado um certo sucesso em determinada época, há muito caíram em desuso. Sua volta ao palco só se justifica em tom de crítica e esta, muitas vezes, quando bem usada, revigora um espetáculo, dando-lhe um certo toque de modernidade ou mesmo o charme do humor. O melodrama, as comédias de época e até o teatro de horror, se encontram entre os melhores exemplos. Algumas vezes até o estilo do rádio teatro e da TV em seus primórdios chega bem à cena, desde que feita uma releitura do veículo.

Bolshoi, o Dragão, com direção de Humberto Torres, em cena no Teatro do Museu da República, poderia ser um desses casos. Mas seu estilo anacrônico de representação tão levado a sério não pode nem ser considerado como uma brincadeira que passou do ponto. O resultado é surpreendente, e essa surpresa não é das melhores.

O texto de Paulo Siqueira, mesmo com algum ranço de um teatro antigo, ou talvez por isso mesmo, tem seus achados. Na corte de Anton II (Alexander Oliveira), sua filha, a princesa Natasha (Danielle Leal), é sequestrada pelo dragão Bolshoi (Alexandre Dias). O rei manda ao reino encantado de Astúnia, onde mora a fera, três heróis: o cavalheiro Lockshide (Eudse Carvalho), Sacha, o bufão (Sandro Arieta) e Vanka, o pastor (Marcelo Cupertino). Mas no decorrer da história se descobre que o terrível monstro tem lá suas razões para se vingar de Anton. O interessante desfecho de revelações ao fim de trama expõe à plateia os dois lados de uma mesma história, sem nenhum compromisso de que esta tome partido de mocinhos ou bandidos. Mesmo porque estes se confundem em ações do bem e do mal como qualquer mortal.

Mas se o texto surpreende o espectador pela estratégia, o espetáculo que se apresenta está muito aquém do que poderia ser. O jovem elenco, quando não está superatuando, se envolve em cacos musicais que naturalmente julgam de maior proximidade com sua plateia. Em meio a demonstrações completamente exteriorizadas do que seria um sentimento de profunda dor, são lembrados os hits do tchan, da boquinha da garrafa ou alguma outra atrocidade de sucesso no verão.

Mesmo assim, não se pode deixar de dizer que Bolshoi, o Dragão, apesar do jogo de equívocos, prende a atenção do seu público, do mesmo jeito que alguns seriados da TV o fazem. O estilo de narrar e agir simultaneamente tão comuns nas brincadeiras infantis tem modelo à altura no palco. Mas é bom lembrar que estes heróis e vilões da plateia escolhem e derrubam seus ídolos em curtíssimas temporadas. Se hoje eu era Jaspion, amanhã sou Power Ranger. E salvo algum grande engano, a intenção do teatro é eternizar protagonistas e antagonistas. Foram os gregos que disseram.

Cotação: 1 estrela (Regular)