Débora Landim e Anderson Cunha. Foto Renato Mangolin

Crítica publicada no Blog Crítica Teatral
Por Rodrigo Monteiro – Rio de Janeiro –
21.10.2012

Um emocionante espetáculo sobre o carinho

“Coisas que a gente não vê” é um excelente espetáculo porque atinge em cheio o alvo, isto é, encara o lado adulto que existe no interior de cada criança. A capacidade, um tanto quanto cruel, da criança de ter que lidar com a solidão, com a rejeição, com a solução dos problemas de relacionamento, com a carência de afeto, desafios esses que parecem estar cada vez mais no dia a dia da infância infelizmente, são o tema da produção que tem Débora Lamm e Kelzy Ecard liderando o ótimo trabalho de interpretação de todos no elenco. Escrito por Renata Mizrahi (Prêmio Zilka Salaberry com “Joaquim e as Estrelas”) e dirigido por Joana Lebreiro (“Meu Caro Amigo”), o espetáculo tem lindas músicas originais de Bruno Alexander e ótima direção musical de Igor Araújo. Em cartaz agora no Sesc Arena Copacabana, mas, em novembro de 2012, no Solar de Botafogo, a produção carioca merece destaque na programação cultural das famílias e de pessoas de todas as idades interessadas em bom teatro.

A peça conta a história de Yasmim (Débora Lamm), uma menina que tem tudo o que quer, mas que não consegue parar de chorar. Sem entender o motivo de tanta choradeira, seus pais, Clara (Kelzy Ecard) e Manoel (Alexandre Moffati), exibem de forma inconsciente o desconhecimento de algo tão sublime: a importância do carinho como expressão maior do afeto. Dividida entre seus dois amigos, Beatriz (Angela Bellonia, substituindo Elisa Pinheiro), menina rica e mimada, que vive preocupada com as aparências, e Raimundo (Anderson Cunha), garoto simples e cheio de vida que gosta de brincar na rua, Yasmin se vê terrivelmente só em seu quarto em pleno domingo de sol. Muitos brinquedos, roupas bonitas e doces à vontade não são o bastante para preencher sua vida ainda tão jovem. Com uma excelente direção de movimento de Sueli Guerra, Joana Lebreiro dá vida a essa história colorida, mas não menos densa. A narrativa, em perfeita ascensão, age no sentido de ir cada vez mais positivamente direto ao ponto: é preciso encarar o problema ao invés de continuar fugindo dele. Tão jovem, Yasmin tem força para mostrar para a plateia de todas as origens e idades um belo exemplo de coragem.

As interpretações são exitosas em todos os exemplos de forma afinada e sem destaques porque todos se destacam em conjunto. Deve-se apenas chamar a atenção para o trabalho de Débora Lamm, porque ela, recentemente, interpretou Isadora, uma outra personagem também menina no espetáculo “Os Mamutes”, dirigido por Inez Vianna, da Cia. OMondé. Correndo o risco de repetir a performance, a atriz vence o desafio e oferece uma figura completamente diferente, mas de novo com ótimo resultado.

O texto rimado de Renata Mizrahi guarda na forma o lugar do lúdico que falta no conteúdo de matriz tão profunda, mas tratado de forma tão delicada e humana. As canções interpretadas por Felipe Ridolfi e por Marcelo Rezende, por sua vez, oferecem o respiro para o espectador que ganha aí o tempo de que precisa para fazer a catarse e se deixar embalar pela história cenicamente contada. Os figurinos e os objetos de cena de Ney Madeira, Dani Vidal e de Pati Faedo são boas menções no espaço cênico, ilustrando, mas também oferendo possibilidades de jogo, sem poluir ou pesar. A iluminação de Aurélio de Simoni age em harmonia com o ritmo e sobretudo com o espaço onde a história se dá a ver.

O bom teatro infantil é sempre aquele é feito para as crianças que vivem dentro dos adultos simplesmente porque é difícil, impossível até, saber ao certo o que se passa esteticamente na cabeça de uma criança para se prever o que, na opinião dela, realmente é bom ou ruim enquanto objeto de arte. “Coisas que a gente não vê”, em forma e em conteúdo, é, por isso, uma produção que emociona e faz refletir digna de muitos elogios. Aplausos!

Debora Lamm, Elisa Pinheiro, Kelzy Ecard, Alexandre Mofati e Anderson Cunha

Idealização e Texto: Renata Mizrahi
Direção: Joana Lebreiro
Músicas Originais: Renata Mizrahi e Bruno Alexander
Arranjos: Igor Araújo, Felipe Ridolfi e Marcelo Rezende
Direção Musical: Igor Araújo
Assistente de Direção: Nathália Melo
Músicos de cena: Felipe Ridolfi e Marcelo Rezende
Iluminação: Aurélio de Simoni
Equipe de Cenário e Figurino: Ney Madeira, Dani Vidal e Pati Faedo
Direção de Movimento: Sueli Guerra
Assistente de Movimento: Priscila Vidca
Preparação Vocal: Pedro Lima
Projeto Visual: Letícia Rumjanek
Assessoria de Imprensa: Daniela Cavalcanti
Assistente de Produção: Marcelo Pires
Produção Executiva: Amanda Lima
Direção de Produção: Maria Alice Silvério Lima
Coordenação Administrativa: Alan Isidio
Patrocínios: Eletrobrás Furnas e Prêmio Montagem Cênica