Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 10.04.1992
Um alegre e criativo espetáculo
Nem só os dicionários, teóricos ilustres e aquela coleção O que é quase tudo tentam explicar o teatro. De uns tempos para cá, o próprio teatro resolveu se explicar em cena aberta para seu público. A questão fica mais inusitada quando a abordagem é feita numa peça chamada Arraiá.
Em cena no Teatro clara Nunes, o espetáculo, com texto muito particular de Denise Crespun, apesar do quilométrico prologo e de excessiva interferência do narrador, tem elementos muito interessantes, fazendo com que a história se conte de maneira inesperada. Numa noite chuvosa em Copacabana, dois irmãos recebem carta do primo do interior pedindo ajuda para a sua crise existencial. A dupla coloca o pé na estrada, e acaba conhecendo muitos personagens no caminho, antes de encontrar o deprimido rural.
Luís Salém, tanto na direção, como no seu trabalho de ator, se revela um profissional brilhantemente intuitivo, e é dessa maneira que ele conduz a encenação. Com um tempo exato de comédia, Salém deixa seu excelente elenco muito à vontade, procurando, no entanto, ressaltar as qualidades individuais de seus atores.
Assim, Márcia Cabrita, mesmo que tenha que lutar com o texto introdutório, rapidamente se transforma na engraçadíssima moça do balcão de informações, para depois viver a Dorothy de O Mágico de Oz, com direito a furacão e todo o resto. A dupla de irmãos, vividas por Catarina Abdala e Luís Salém, desenvolve seus personagens de maneira divertida, com nuances bem marcadas, imprimindo um ritmo adequado à encenação. A grande surpresa, no entanto, fica com o coringa Ernesto Piccolo, que faz seus muitos tipos com incrível versatilidade, não repetindo ganchos de humor em nenhum deles. Da loura telefonista do serviço de desinformação à extremada mamãe africana, passando pelo deprimido primo Zé Boquinha e, finalmente, no duplo papel dos cantantes caipiras Zé e Ritinha, Piccolo revela todo o seu talento na caracterização dos seus bem concebidos personagens.
Arraía, além da competência de elenco e direção, tem ainda como grande trunfo os figurinos e adereços de Carlos Batata, que por si só constituem um show à parte, esbanjando criatividade poucas vezes vista. De resto, os futuros acertos, por parte da operação nos demais elementos de apoio técnico, por certo tornarão esse Arriá um cult espetáculo para crianças e adultos e outros fãs dom humor.
Cotação: 3 estrelas