“Precisamos de uma rede que reúna todos os que fazem teatro para crianças e jovens no Brasil!”
Uma rede em que a informação possa ser capturada e continuamente transmitida – sobre o queremos, o que planejamos e o que gostaríamos de fazer
Precisamos de uma rede nacional criada pela nossa real necessidade! A chance de uma rede ou projeto conseguir se desenvolver e sobreviver é determinada pela real necessidade em que foi criada, além do entusiasmo e inspiração dos que a tenham formado.
Começando por um lugar comum
Pensar em uma rede que una a todos nós que pensamos, criamos e apresentamos teatro para crianças e jovens se torna algo imprescindível num país de dimensões e diversificada cultura como o Brasil.
Nada mais difícil, sabemos todos. Os problemas de cada um individualmente, seguidos pelos da sua cidade, quem sabe com sorte os da sua região, sugam toda a nossa energia e (principalmente) o nosso tempo.
Associados
Vivemos em um mundo de comunicação e networking. Quanto maiores forem as diferenças que descobrirmos no trabalho de outros artistas que trabalham para um público jovem, maior a vontade de conhecer o que mais está sendo produzido neste ramo, maior a vontade de conhecer outros artistas, fazer projetos juntos, estar juntos, seja para discutir, fazer e ver espetáculos, e estar associados numa rede que nos mantenha juntos.
Uma rede em que a informação possa ser capturada e continuamente transmitida – informação sobre o queremos fazer, o que planejamos fazer, sobre o que gostaríamos de fazer.
Minha experiência, quando eu morava em São Paulo, entre 2000 e 2006, foi esclarecedora. Vinda da Alemanha, onde testemunhei ao vivo o impressionante trabalho da KJTZ, o equivalente na Alemanha da Assitej (Associação Internacional de Teatro para Infância e Juventude), vim cheia de entusiasmo para relatar sobre o trabalho feito para público jovem naquele continente e as reflexões novas e emancipadas da arte que se deveria oferecer para crianças.
Encontrei algo surpreendente: a Cooperativa Paulista de Teatro e sua incrível história de sucesso, unindo artistas que trabalham em teatro, em torno, em uma primeira análise, de uma figura jurídica que permite trabalharmos sem o pesado custo de ter de formar uma empresa própria. Com o passar do tempo, me foi ficando clara a complexidade da influência da Cooperativa em vários níveis, principalmente político.
Trocar ideias
Tive a honra de ser indicada para o Conselho Consultivo da Cooperativa e foi muito interessante trocar ideias e fazer propostas com um grupo entusiasmado, engajado pelo bem comum. Por outro lado, não posso negar, vivi a experiência decepcionante que foi a tentativa de criar uma rede regional do CBTIJ (Centro Brasileiro de Teatro para Infância e Juventude), que é a Assitej no Brasil (em São Paulo, a sigla muda para CPTIJ, Centro Paulista).
Partindo de uma visita de Luiza Monteiro, na época a representante do CBTIJ no Comitê Executivo da Assitej Internacional, um grupo de artistas e produtores que trabalham nesta área, ao qual me incluo, decidiu formar/reviver uma associação que reunisse os grupos da cidade de São Paulo.
Apesar de muitos colegas dedicarem muitos meses num esforço extraordinário para criar um estatuto, eleger uma diretoria, arrecadar fundos, ter um espaço físico para escritório, participar de mesas, organizar seminários, ao final de aproximadamente 2 anos, tudo terminou sem deixar traços de existência.
Em 2006, retornei à Alemanha, mas continuo acreditando que os artistas e grupos que criam teatro para crianças e jovens no Brasil não desconfiam do poder, também político, de que estão abrindo mão ao ignorarem esforços para criar uma rede nacional que efetivamente os una em comunicação e networking. Literalmente, quem está conectado tem a força, onde há a rede vem a influência e a verba para realizações.
Um paralelo
Escrevo hoje, fim de junho de 2016, a alguns dias do referendo no UK (Reino Unido) que escolheu subir muros ao invés de manterem-se conectados à EU (União Europeia); não posso deixar de pensar nos paralelos com a nossa situação, a de quem faz teatro para infância e juventude. Ilude-se quem pensa que garantir exclusividade para obter vantagens para o seu grupo, excluir ao invés de agregar, garanta uma posição privilegiada, seja na situação que for.
Venho a Birmingham para o Festival On The Edge, onde haverá um encontro da Assitej Internacional, desta vez representando a recém-nascida Assitej Chile, onde resido. Tenho grandes esperanças em uma rede latinoamericana nos moldes da Assitej e assim poder contribuir no que possa, para uma rede realmente significativa para todos que fazem teatro para crianças e jovens no Brasil.
O intercâmbio a partir do encontro, da pausa para a discussão e reflexão, a constatação, que não é auto evidente, de que há teatro profissional para crianças e jovens em todos os lugares. Uma rede que seja também assistência, decência e coragem neste momento de apatia cultural.
Bebe de Soares
Amazonas Network é uma rede criada em 2002 em São Paulo, Brasil, para incentivar o intercâmbio internacional na área de teatro para o público jovem e de dança. Sua fundadora e diretora artística é Bebê de Soares, atriz, coreógrafa, diretora e tradutora brasileira radicalizada na Alemanha. A Amazonas Network faz o management de várias companhias e atua em diversos países, principalmente na Alemanha, no Brasil e a partir de 2011 com sede no Chile.
Obs.
Texto inicialmente publicado no Site Pecinha É a Vovozinha!