Critica publicada no blog Crítica Teatral
Por Rodrigo Monteiro, em 10.09.2013
O imperdível O Jardim Secreto
O Jardim Secreto foi publicado em 1911, sendo a obra mais conhecida da escritora inglesa Frances Hodgson Burnett (1849-1924). Agora em cartaz no Centro Cultural do Banco do Brasil, a peça dirigida por Rafaela Amado e por Mariah Schwartz traduz bem os motivos dessa fama ao longo do último século. Lançada em plena era do funcionalismo, o livro e a peça têm como protagonista a menina Miranda que, deixada em férias na casa de um tio desconhecido, deve ir atrás do seu lugar no mundo. No universo de Burnett, a passagem do século XIX para o XX, todos têm uma função e só é permitido existir se esse existir seja consciente (e positivo). Cem anos depois, felizmente, a complexidade do “simplesmente existir” deu a esse existir uma função já bastante responsável, de forma que o caminho de Miranda é, como nunca, o nosso. Daí a importância da produção desse projeto e de sua participação na programação de teatro carioca. Embora destinado ao público infantil, eis aí mais um excelente espetáculo que é indicado para toda a família apesar do horário das 16h.
Com texto adaptado por Renata Mizrahi, O Jardim Secreto narra o encontro de três crianças que nunca se viram em uma casa imensa de campo. Miranda e Gregório são primos e Nicolau é jardineiro na propriedade do segundo. Enquanto um traz a natureza, outro traz as ideias e um terceiro traz a emoção à essa receita repleta de mensagens que, embora muitas vezes ouvidas, jamais devem ser esquecidas. Manter vivos os sonhos, ir corajosamente em busca dos objetivos, aquecer o coração e olhar para o próximo com a mesma estima com que se olha para si são chaves que podem abrir imensos e coloridos jardins secretos. No mesmo sentido, o texto reforça a importância de cultivar a paciência de esperar pela primavera e a certeza de que, embora não estejamos vendo, a terra está trabalhando em prol das flores e dos frutos. Com um cenário rico em lugares próprios para o desenvolver da imaginação, a peça permite que nos identifiquemos facilmente com um ou com mais personagens em cada um de seus momentos narrativos.
Apesar de haver protagonistas e coadjuvantes, isto é, papéis com mais e com menos oportunidades, o elenco apresenta um resultado bastante equilibrado em alto nível de excelência. Amado e Schwartz mantêm um ritmo firme, coeso e coerente, convidativo para a cartarse e motivador da resolução do conflito que bem nos empurra para o final, esse em um ápice bem estruturado, potente e sobretudo lindo. Elisa Pinheiro (Miranda), João Velho (Nicolau) e Arlindo Lopes (Gregório) não perdem um só momento de evidenciarem suas construções e articularem-se junto aos demais na movimentação de um todo bem amarrado. Há carisma, há excelente uso da voz, das pausas, das intenções, além de situações criativas, tais como Nicolau tentando ajudar Miranda a convencer Gregório de que ele não está doente, Miranda e Nicolau interagindo com o passarinho Fufifo, Gregório voltando a caminhar. Por outro lado, Camilla Amado (Dona Gertrudes), Luiz Henrique Nogueira (Tio Heitor e A Sofá) e Graziela Müller (Cadeira) se tornam personagens fortes porque seus intérpretes assim o dão a ver: excelentes entonações, excelente uso do tempo e dos movimentos (esses positivamente sutis) e excelente jogo cênico nos diálogos, nas entradas e nas saídas. É bastante acessível ao público de todas as idades os diversos níveis possíveis de interpretação da história contada em termos, por exemplo, da curva dramática feita por Heitor e por Dona Gertrudes e da sabedoria de A Sofá e da Cadeira. O acordeom tocado por Müller marca a poesia, reforça a concentração dos símbolos, aponta para o foco mais importante, o que define com exuberância o trabalho de direção.
Além do já exposto, O Jardim Secreto tem um lindo cenário de Analu Prestes, um lindo figurino da Espetacular Produções & Artes, um lindo desenho de iluminação de Luiz Paulo Nenen, uma linda trilha sonora de Marcelo Alonso Neves e um lindo trabalho de videografismo de Paola Barreto, Lucas Canavarro e de Alexandre Antunes. Normalmente, em uma análise técnica de uma obra artístico-cênica, apontar como “lindo” um objeto/elemento estético é, ao mesmo tempo, apontar definitivamente para o gosto pessoal do analista. Nesse caso, aposta-se no contrário. Ser lindo já é o bastante e não necessariamente carecem-se de justificativas.
O Jardim Secreto é uma das melhores produções em cartaz na cidade atualmente. Que tenha vida longuíssima!
Camilla Amado, João Velho, Elisa Pinheiro, Arlindo Lopes, Luiz Henrique Nogueira, Grasiela Müller.
Inspirado na obra de Frances Hodgson Burnett
Adaptação: Renata Mizrahi
Colaboração de Texto: Isabel Falcão, Luisa Arraes e Mariah Schwartz
Direção: Rafaela Amado e Mariah Schwartz
Direção de Produção: Gustavo Nunes
Cenário: Analu Prestes
Cenotécnico: André Salles
Figurino: Espetacular Produções & Artes – Ney Madeira, Pati Faedo, Dani Vidal
Design Gráfico: André Coelho
Vídeos: Paola Barreto/ Lucas Canavarro
Iluminação: Luiz Paulo Neném
Trilha Sonora Original: Marcelo Neves
Assessoria de Imprensa: Will Comunicação/ Luiz Menna Barreto
Diretor de Movimento: Rafaela Amado / Mariana Baltar
Maquiagem: Fernanda Santoro
Contraregragem: Felipe Ávilla
Equipe Turbilhãozinho de Ideias:
Produtor Executivo: Márcia Goulart
Coordenação de Produção: Gabriela Munhoz
Administrador Financeiro: Leonor Camargos
Gerente de Projetos: Elisa Padilha
Assessora de Projetos: Larissa Altoé
Assistente de Produção: Ariana Teixeira
Secretária: Geysa Seiça
Coprodução: Turbilhãozinho de Ideias Cultura e Entretenimento Ltda e Focus Filmes
Realização: Centro Cultural Banco do Brasil