Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 16.03.1975
A Varinha do Faz de Conta
Eis aí uma montagem corajosa. É preciso muita ousadia na criação de um espetáculo praticamente sem texto, fundamentado apenas em coreografia, luz, som e expressão corporal – para crianças. E baseado, principalmente, na capacidade lúdica e de fantasia do público infantil. Não acontece nada expressivo ou excepcionalmente extraordinário no palco, mas o espetáculo tem um charme todo particular, as músicas são agradáveis, o elenco é simpático e a montagem tem uma boa dose de beleza e de poesia. As cenas finais (o boa-noite e o fiquem para sempre com a gente) são momentos que conseguem unir sensibilidade à simplicidade. Esta é uma peça que mostra que com pouco dinheiro e certa imaginação são plenamente possíveis montagens de bom gosto.
A frustração maior do espetáculo é que ele, apesar de corajoso em sua forma, é demasiadamente tímido em suas ideias. A historinha (brinquedos que resolvem se divertir enquanto o dia não amanhece) é muito pobre e as próprias brincadeiras dos bonecos são excessivamente fáceis. Se houvesse uma ideia mais estimulante e original para a trama, certamente a coragem formal seria beneficiada. Desta forma, apesar de o espetáculo durar pouco tempo, ainda assim fica cansativo. A direção de Gene Bowles, sem grandes voos, mas, também, sem erros graves, poderia se lembrar que o silêncio é um elemento expressivo e que há um sem número de brincadeiras que os bonecos poderiam fazer apenas com expressão corporal, sem o constante playback. O diretor e o auto (Hugo Sala) esquecem-se, também, de toda a imensa potencialidade da utilização dos sons específicos de cada boneco. O elenco está muito bem ensaiado, está seguro, é simpático e comunicativo, mas deixa visível sua pouca experiência de palco. Destaca-se Hugo Sala, com corpo expressivo, domínio de gestos e um tempo perfeito. Para que seu trabalho fosse ainda mais limpo, seria preciso, apenas, diminuir um pouco as caretas (que, por sinal são sempre iguais). O espetáculo mostra uma boa preocupação com o aspecto plástico e a peça, neste particular, consegue acertar mais que errar, apesar da existência de um cenário esteticamente muito pobre e de figurinos que criam uma certa desarmonia visual (apesar do tom alegre e vivo das cores).
A Varinha do Faz de Conta não apresenta nada excepcional, mas é certinho, bem cuidado, tem bom gosto, envolve a criança em poesia e beleza. Enfim, é um espetáculo que respeita o público infantil. A não ser, é claro, quanto à hora de começar: aí, o desrespeito é total.
Recomendações:
Sem restrições: História de Lenços e Ventos
Com pequenas restrições: A Varinha do Faz de Conta e Você Tem um Caleidoscópio?