Matéria publicada no SBAT Boletim – nº 252 – Pag. 13
Sem Identificação – Rio de Janeiro – Jul/Ago/Set 1949
Um Teatro para Crianças
De uma crônica de Yvonne Jean, publicada no Correio da Manhã, extraímos as considerações que reproduzimos abaixo, em torno de uma conferência que a brilhante escritora Lucia Benedetti fez sobre o teatro infantil, no 3º Congresso Infanto-Juvenil, promovido pela Associação Brasileira de Educação:
Numa dessas noites, Lucia Benedetti falou de um assunto que conhece melhor de que ninguém: o teatro infantil, cuja história retratou rapidamente. Depois do Casaco Encantado, que abriu nova era na vida das crianças brasileiras, sete peças de autores nacionais foram representadas tão somente. Examinando as razões desta escassez, Lúcia Benedetti comprovou que não era devida à falta de interesse, mas a diversos obstáculos materiais.
Um deles, que se aplica também aos autores teatrais para adultos, é a quase impossibilidade de editar peças. Os contistas, romancistas, ensaístas, cronistas e poetas encontram editores. Ninguém está interessado em publicar peças de teatro, o que, nos outros países, é a sequencia natural do êxito teatral. Lembro-me da “Illustration” de Paris, que a maioria comprava exclusivamente por causa do suplemento teatral que acompanha cada número. E na hora em que surgem diversas revistas literárias sérias, estou a perguntar se uma dentre elas não poderia seguir este exemplo, publicando também um suplemento teatral. Seria uma tentativa original e interessante. Se fosse bem sucedida, animaria os editores, que dariam enfim uma oportunidade aos autores teatrais.
Outro problema, examinado, por Lucia Benedetti, é a falta de teatros. E quando uma companhia resolve este problema, tem de enfrentar a pobreza de maquinaria, que impede a criação de um mundo de fantasia.
É evidente que o teatro infantil não vive exclusivamente de realizações luxuosas. A imaginação das crianças completa as falhas nos cenários. Basta, muitas vezes, dizer a um menino que tal árvore representa uma floresta ou mesmo que uma cadeira é o mar para que imagine imediatamente bichos selvagens e ouça o barulho da tempestade. Lucia Benedetti lembrou, aliás, este ponto descrevendo o teatro portátil criado por Stuart Walker nos Estados Unidos, em 1915. Exigia pouca roupa e cenários simplificados. O palco era tão pequeno que só dava lugar para dois atores ao mesmo tempo, o que exigia peças especialmente escritas para ele, mas permitia dar espetáculos em qualquer salão. Esta técnica deve interessar os diretores dos teatrinhos de bolso que tanto fizeram para o público infantil. Mas as crianças também têm direito a espetáculos que não sejam de emergência.
Lucia Benedetti lembrou o projeto que acaba de ser apresentado pelo vereador Jorge de Lima propondo a construção de um teatro municipal infantil na Quinta da Boa Vista, que, graças ao Jardim Zoológico, se tornou o domínio dos meninos. Esse teatro seria à medida dos pequenos, com poltronas baixas, afrescos alegres, uma enfermaria na qual seriam socorridas as vítimas dos tombos, indigestões e outros dramas infantis. Permitiria realizações muito variadas.
Esperemos que o prefeito compreenda a importância e a urgência de um projeto que animará escritores, cenaristas e atores e transformará os espetáculos infantis de emergência em realizações permanentes. O país do fazer de conta é tão maravilhoso que nenhuma técnica permite realiza-lo. Mas demos, pelo menos, aos pequenos, um mundo digno da sua imaginação, que tanto aprecia os peixes que voam nos ares, as fogueiras que não queimam, as noites azuladas e as fadas que reluzem como o sol.