Marcia Viveiros (E) Iara Porto e André De Angelis participam de ‘Portinari – um menino Brodósqui’, em cartaz no Teatro do Jockey.


 

Crítica publicada no Jornal do Brasil
por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 19.03.2005

 

Barra

Portinari para crianças

Entusiasmo do elenco é o grande trunfo de montagem sobre a vida do pintor

Portinari-um Menino de Brodósqui, em cartaz no Centro de Referência do Teatro Infantil Teatro do Jockey, caminha pelo fio da navalha entre o teatro tomado como pura obra de arte e o que é, ao mesmo tempo, informativo. Mas a direção do também autor André Brilhante dribla esta dificuldade suavizando o tom didático tão questionado nas produções para crianças.

O espetáculo caminha entre dois outros eixos: o contar, típico da narrativa, e o mostrar, característico do texto teatral. Durante os 30 minutos iniciais predomina o contar, repleto de informações. Apenas da metade em diante o mostrar surge com um pouco mais de intensidade, mas, no todo, trata-se de uma montagem em que predomina a narrativa oral cênica.

A história do pintor Cândido Portinari (1903-1962) é contada em flashes, enquanto André Brilhante vai reconstruindo o universo imaginário do menino de Brodósqui. No entanto, a excessiva necessidade de informar, não nos mostra, através da ação, este universo – na maior parte do tempo o texto aborda a realidade cultural popular do interior do país, dando pouca margem a que a criança viva esta realidade, o que seria possível através da magia do teatro.

Diretor suaviza o tom didático que permeia o espetáculo

A história se inicia com três pintores de parede que resolvem falar sobre a vida de Portinari. Primeiro falam das formas e das cores. Na sequência, dos brinquedos e brincadeiras típicos da época. Depois, dos contos populares. No meio da história, irrompe um circo que passa pela cidade e aí a linguagem circense é bem explorada.

Mas a proposta do grupo é explícita: “seus integrantes – artistas e educadores – trabalham na criação de peças teatrais que associam conhecimento e diversão, através de espetáculos pautados no humor e lirismo que sensibilizam a criança e levam à reflexão sobre determinados temas.” Esta “profissão de fé” do Grupo Preto no Branco, dirigido por André Brilhante, mestre em arte-educação, define a opção do grupo por um teatro que caminha próximo da arte-educação.

Plasticamente, o espetáculo busca uma simplicidade estética que beira o ingênuo, a partir de elementos do cotidiano de crianças do interior que inventam seus brinquedos e brincadeiras. Nesse sentido, os figurinos e adereços de André De Angelis e o cenário de Márcia Viveiros poderiam remeter com mais criatividade a este universo. A luz é correta e a trilha musical de Warley Goulart poderia explorar mais o imenso repertório popular que, certamente, fez parte da evidente pesquisa do grupo. Os atores estão à vontade no jogo e passam deste universo ao dos adultos com facilidade. Demonstram vigor cênico e prazer de estar no palco, um trunfo da companhia. Destaca-se a atuação de Márcia Viveiros, que desenvolve seu personagem com muito humor.

Apesar da estrutura narrativa não seguir os cânones da escrita dramatúrgica, ficando entre o contar e o mostrar, o informar e o vivenciar, o simples e o criativo, a história de Candinho e a informação sobre o interior brasileiro, André Brilhante dribla as armadilhas típicas do espetáculo meramente informativo, sobretudo por meio das brincadeiras que consegue instaurar no palco. No entanto, o tema vida e obra de Cândido Portinari, sem dúvida tem possibilidades teatrais infinitamente maiores do que as exploradas em cena.