Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 27.09.1980

Barra

Sonho, Só Sonho

O autor Ronaldo Ciambroni parte de uma ideia não muito original, mas que carrega um grande potencial criativo – uma reunião de mendigos – e procura mostrar, através de personagens marginalizados, o que existe no ser humano em nível de fantasia, de modo, de poesia, de fraternidade, e de solidão. Entretanto, o resultado, não é feliz. O texto, na busca de uma linguagem poética, acaba escorregando, às vezes, na má literatura (“A noite é mágica porque brilha e nos enche de surpresa” / “O broche é a lua!” / “A noite é sempre uma criança quando a gente quer brincar”.) e, na busca de trabalhar a consciência de seu público infantil, levando as crianças a uma visão de mundo mais aberta, acaba apenas sendo didático. Eis alguns exemplos: “Não se deve ter medo de parar de sonhar e viver o que tem de se viver” / “Não se deve ter medo de ser adulto e matar a sua criança” / “Vontade a gente sempre tem: à força é que é pouca”. “Impossível é contar histórias e não viver nenhuma” / “Impossível é amar quando o sonho é só sonho”. Além disso, o autor ainda discorre um pouco sobre o real, as cores e o alfabeto. Dessa forma, as boas intenções se frustram e a direção de Maitê Alves ainda contribui para isso ao realizar um espetáculo pesado, escuro (por ser à noite, o palco não tem que estar, necessariamente, escurecido), frio, sem  apelos visuais e com um desenvolvimento que não cria um interesse crescente no espectador; pelo contrário. A direção procura criar com seus atores um certo tom de humor que, infelizmente, nem sempre funciona. O melhor momento é sem, dúvida, quando todos resolvem “chorar juntos”.

O melhor trabalho está a cargo de Nelson Melin, autor das músicas. Mais uma vez, entretanto, vemos um espetáculo para crianças com bonitas canções, porém mal executadas. Melin, também o diretor musical, criou interessantes arranjos vocais, mas é inútil, já que os atores não cantam bem. O exemplo mais forte é a bela canção do sertão que obteria um resultado muito melhor com atores que cantassem. O elenco funciona corretamente, destacando-se a composição de Gilberto Britto para o cego (“Zé da Viola”) e o desempenho de Isa Fernandes como Caxuxa. Sonho, Só Sonho, está em cartaz no Teatro Dulcina.