Crítica publicada no Jornal do Brasil, Caderno B
Por Eliana Yunes – Rio de Janeiro – 02.05.1987
Sob a Lona do Circo
“Hoje tem espetáculo? Tem, sim, senhor.” Para a grande maioria das crianças dos grandes centros urbanos, a magia do picadeiro só existe nos livros de histórias. A figura colorida do palhaço foi absorvida pela mídia eletrônica e desaparece sob a massa de desenhos animados e jogos sem graça. Em março, o dia do Circo passou quase em branco, apesar do incentivo do INACEN à Escola Nacional do Circo, na Praça da Bandeira, Rio.
Agora com o toldo armado do Circo Bartholo, na Cidade Nova, as crianças podem experimentar a fantasia de conhecer um picadeiro. Apesar do aperto, dos preços, do desconforto, elas ficam horas na fila, aguardando a entrada sob a lona, onde malabaristas, ginastas, palhaços, domadores, trapezistas fazem o encanto de hora e meia de espetáculo, com cores, movimentos e muita música.
É verdade que as “gracinhas” dos palhaços ás vezes não têm graça; outras vezes apesar de antigas, pegam pelo pé a criançada. Os elefantes e os leões estão velhos e cansados, mas a função do adestramento não se perdeu. Muito menos o
suspense grifado pelos tambores quando os trapezistas em saltos mortais piruetam no ar. É todo um clima diferente dos teatros que as crianças costumam frequentar, a começar pelo rigoroso horário do espetáculo e o contato com a
multidão: mais além, o voo da imaginação coloca sobre a corda bamba suas emoções. As “famílias” de artistas se sucedem em cada número, criando empatia imediata com o público, pelas fantasias que despertam esses habitantes de
trailers e lonas.
Justamente para retratar esse mundo mágico do circo, está no programa cultural uma visita obrigatória para crianças, ao Museu Edison Carneiro, dentro do parque do Museu da República, no Catete. Artistas plásticos populares recriaram em miniaturas as cores e figuras do circo, e até uma preciosa montagem articulada, de Adalton Lopes (RJ), reproduz os sons, os gestos e as encenações de um picadeiro de verdade.
Circo: tradição e arte é o título da exposição do INF-Funarte que deseja divulgar um panorama amplo dessa
manifestação popular: palestras, filmes, vídeos, áudios, entre apresentações de artistas circenses e atividades infantis, enchem as tardes de domingo no local, onde a preciosa coleção de cartazes e fotos de Júlio Amaral de Oliveira conta a
história da tradição do circo no Brasil. Diga-se de passagem que o catálogo a cores é uma síntese de acabamento perfeito para a pesquisa realizada sobre a vida nômade desses artistas infatigáveis, destacando-se os brinquedos e
trabalhos que têm o palhaço como tema, a magia do circo foi de fato captada pelos artistas que expõem e pelos organizadores da mostra. Hoje e amanhã tem o filme O grande palhaço, de William Cobbett. São todos curtas capazes de encantar pais e filhos.
A sugestão é para um passeio completo, do espetáculo ao vivo até a reflexão histórica e artística.