Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 02.09.1998
A graça da vez não tem apelação
Muita coisa estranha já aconteceu no Planalto Central do país. A melhor delas não está ligada nem à política nem ao Vale do Amanhecer, mas ao humor. Com ele, a Companhia de Comédia Os Melhores do Mundo, grupo teatral de Brasília, chega ao Teatro Rubens Corrêa para mais uma temporada-relâmpago, as terças e quartas, às 21h. A graça da vez é Sexo, peça em cinco esquetes que tem feito a plateia de Ipanema rir como há muito tempo não acontecia.
O espetáculo, escrito, dirigido, cenografado e o que mais vier a ser creditado, têm a grife da companhia. Em cena, Adriana Siri, Jovane Nunes, Ricardo Pipo, Victor Leal e Welder Rodrigues se multiplicam em muitos personagens para falar de sexo sem nenhum tom apelativo, cena de mau gosto ou outras “produções” que costumam vir a reboque quando se trata do tema. Mas não se enganem, Sexo também não é um tratado tipo relatório Hite ou Máster and Jonhson. Aqui tudo é humor.
No palco, tudo começa no set de um filme pornô, quando a atriz entediada tem que esperar o seu parceiro, recém-contratado, “entender” o real clima de intenção do diretor. O segundo esquete, Acessórios, é uma réplica de Pergunte ao Mike, um cult dos shops shows da TV. O próprio Mike é igualzinho ao da televisão, com seus trejeitos exagerados. Também “no ar” as vozes gritadas e as piadas sem tradução. Uma delícia, Amor Possessivo mostra um casal gay e sua despedida na rodoviária. Emílio arma o maior escândalo, quando Montenegro tem que sair em viagens de negócios. Também um humor de clichês dos mais bem feitos. Adultério começa com uma conversa entre amigos nos moldes mais bem-comportados e chega ao escracho final num crescendo hilariante. Uma marca da companhia, que a cada espetáculo se aperfeiçoa no casual bem planejado.
O esquete final, mesmo tratando de um tema que já chocou a plateia lá pelos anos 60, Oh Calcutá, é sem dúvida o melhor do espetáculo: Swing. Maria Lúcia e Paulo Sérgio recebem em sua casa Alair e Zuleika, uns caipiras endinheirados que revolucionam qualquer encontro do gênero. Num humor muito pouco óbvio, que não divide o quadro em avançadinhos e caretões, o esquete dá ao espectador, o esquete dá ao espectador a impressão de que é criado naquele momento. Esse é um dos grandes trunfos da encenação, o humor para ser “espiado”, bem ao gosto dos voyeurs, como se o que estivesse em cena, mesmo às situações mais absurdas, fosse obra do acaso. Estratégia que dá ao espectador a condição de privilegiado, ou seja: estar no lugar na hora exata. É o que acontece.
Numa produção despretensiosa, Os Melhores do Mundo armam seu espetáculo num sobrepalco onde se usam apenas uma ribalta e uma cortina vermelha. Os figurinos têm como base um smoking adereçado conforme a situação. Tudo funciona.
Sexo é uma comédia em alto estilo de humor, que mesmo sem muito alarde na mídia vem lotando o Teatro Rubens Corrêa. O tal do boca a boca leva o público a ver e rever um espetáculo até transformá-lo em cult. Já aconteceu.
Cotação: 4 estrelas (Excelente)