Crítica publicada no Jornal do Commercio
por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 22.02.1997
Sete Corações Poesia Rasgada
Espetáculo pleno de lirismo e sensibilidade
O Teatro Ventoforte se tomou marco na história do teatro infantil, quando Ilo Krugli, nos anos 70, revolucionou a estética, a proposta de encenação e as temáticas dos espetáculos voltados para a criança com o espetáculo História de Lenços e Ventos.
Historicamente fundamental no percurso do teatro para crianças, o Teatro Ventoforte, está, hoje, radicado em São Paulo, num espaço magnífico, onde há dois teatros, e onde são desenvolvidas oficinas, workshops, e trabalhos de arte-educação, mantidos por uma filosofia de trabalho quase comunitário, onde até mesmo um almoço coletivo diário faz parte da programação do espaço.
Com curso de teatro para criança, jovens e adultos, Ilo Krugli desenvolve uma produção teatral com características de linguagem peculiares e já totalmente identificadas na variada produção teatral do espaço Casa VentoForte.
Autor, diretor, artista plástico, animador cultural, enfim, o Mestre Ilo, é um dos realizadores mais premiados e conceituados não só no Rio de Janeiro e em São Paulo, mas em todo o país e no exterior, onde apresenta seu trabalho em Encontros e Festivais. Por isso é fundamental que o grande público não perca a oportunidade de assistir Sete Corações Poesia Rasgada. Para o grande público é imperdível, para os realizadores de teatro infantil, professores e educadores, é fundamental e obrigatório.
O espetáculo é uma homenagem a Frederico Garcia Lorca, numa reinvenção dramatúrgica de Ilo Krugli, onde a poesia e a criança, em sua essência, se unem num espetáculo participativo, onde todos são estimulados pelo poético e pelo fazer poético, pela sensibilização, pela re-criação, pelo lúdico, pela teatralidade. É, antes de tudo, um exercício de sensibilização para o mundo e para a vida; espetáculo repleto de senso crítico, com uma abordagem sócio-política – absolutamente identificados ideologicamente Lorca e Ilo.
Sete Corações complementa os trabalhos do VentoForte de 1996: As Quatro Chaves, O Rio que Vem de Longe e Histórias que o Eco Canta (três contos de Oscar Wilde) e é um indicador de como Ilo Krugli vê o público infantil – uma proposta de trabalho consequente e continuado; espetáculos que se preocupam, antes de tudo, com este ser em formação e que oferecem a eles o que teatro tem de mais específico. Como diz o próprio grupo, é um trabalho, de jogo do resgate e da sobrevivência do teatro.
Com uma proposta de encenação que o público do Rio de Janeiro não está habituado a ver, Sete Corações têm visual cênico e figurino de Ilo Krugli; canções e músicas de Eddgard Lippo e João Poletto, com letras do próprio Krugli e de Lorca; os bonecos, uma forte linguagem no teatro de Ilo Krugli, são confeccionados por Cláudio Cabrera e Paulo André. A brilhante direção musical é de João Poletto e a direção geral de Ilo Krugli.
É evidente que o teatro tem muitos caminhos, mas este que vem sendo trilhado há anos por esse criador, que tem gerado outros grupos igualmente respeitados e conceituados, como o Grupo Hombu, e que traz uma proposta de trabalho, que se não é para ser seguida, como regra ou receita, é para ser vista, pensada, e discutida esteticamente, conceitualmente.
Sem dúvida, será além de tudo, um raro prazer para as crianças que participam deste momento poético tão bem engendrado estética e teatralmente por Ilo Krugli; para os pais que estarão plenos de satisfação por verem seus filhos participarem de um raro evento teatral, de qualidade, pleno de poesia, lirismo, construído de forma lúdica e participativa, com bastante humor, onde, em determinado momento, tudo se torna uma grande brincadeira teatral, mas que se fala de liberdade e opressão; da morte e renascimento do poeta – e da poesia.
Tudo é colocado em cena com sensibilidade e competência que nos faz sair do teatro encantados, sensibilizados, emocionados, e repensantes sobre os verdadeiros valores que importam para o ser humano nessa curta trajetória que é a vida. É um presente para as crianças, um conforto para os pais, um estímulo para os criadores, um questionamento para os educadores.