Riokay e o Lugar Onde não se Morre: belas imagens visuais

                                                                                                                                                

Crítica publicada no Jornal do Brasil 
por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 20.06.2004

 

 


Barra
Às cegas no caminho

Diretor se perde ao narrar trajetória do herói Riokay

Riokay e o Lugar Onde não se Morre não cumpre o que promete em seu início. Em cartaz no Teatro do Jockey, com texto e direção de Antonio Carnewale, Riokay tem como ponto alto a sinceridade com que o autor/diretor conta a história, além da singeleza estética  com que abre o espetáculo. No entanto, no decorrer da apresentação, surgem problemas, não apenas na estrutura narrativa, mas também na encenação.

A história pretende refletir a “trajetória do herói” – o personagem Riokay parte em busca do lugar onde não se morre. Toda “trajetória de herói” implica em uma série de dificuldades e obstáculos que o protagonista vai vencendo, num crescendo, até chegar ao clímax do que está sendo contado. É este desenvolvimento da ação, onde o meio se liga ao início e o fim ao meio que dá organicidade ao texto e mantém a unidade de ação.

Riokay cai na armadilha da adaptação, que é uma difícil técnica de transposição de linguagens. Mesmo bons autores não são necessariamente bons adaptadores. Na montagem, duas fábulas, uma japonesa e outra do italiano Italo Calvino, compõem o texto. Ambas são de natureza estritamente filosófica. Principalmente por esta razão tornam-se fundamentais ações que revelem essa filosofia. No espetáculo, o autor e diretor tenta resolver tais questões com os encontros com os sábios. Mas os encontros são  narrativos, não havendo ação dramática que evidencie o subtexto das histórias.

Riokay faz sua trajetória sem deixar “caminho” para que o espectador estabeleça empatia com o herói, porque não existem conflitos claros que coloquem o público dentro da peça teatral. Tanto que quando o herói descobre que o lugar onde não se morre está na memória do outro esta conquista não provoca nenhuma emoção nem reação no público.

No palco estão três segmentos distintos: o texto, o elenco e a encenação que a direção de Carnewale não conseguiu unificar. Erom Cordeiro, substituindo Rodrigo Maia, fez, no dia em que o crítico assistiu à peça, com competência e equilíbrio o personagem Riokay. Também o diretor Antonio Carnewale fez vários personagens nesse dia, mas ficou clara a  falta de tempo hábil para construções mais consistentes.

Rogério Freitas consegue tirar humor de suas intervenções, embora desvie o foco da narrativa para sua performance de ator, o que não ajuda a contar a história. Evandro Melo se destaca, embora em pequenos papéis. O ator mantém a coerência de sua composição inicial e, mesmo nos momentos de humor mais forte, não perde a proposta que definiu para o seu personagem: economia. Maria Assunção, nos papéis míticos de A Morte ou O Tempo exagera no humor ao compor esses personagens.

Montagem tem como ponto alto a sinceridade do autor e diretor 

Fica claro que o grupo de criadores, principalmente autor, diretor e atores não apostam na força dramatúrgica que o teatro tem para prender, com sua mágica, a atenção das crianças, já que recorre muitas vezes a um humor que não tem o refinamento que o texto e o espetáculo requerem.

A própria movimentação, com direção de Sueli Guerra, fica entre a beleza oriental e a caricatura. Não fica evidente a proposta, o que contribui para tornar a encenação irregular. Há um belo desenho cênico, com coreografias marcadas com precisão. No entanto, o excesso de objetos cênicos no palco evidencia necessidade de suprir a ausência de uma ação dramática bem estruturada, que é o que prende a atenção do espectador. Outra observação a ser feita se refere à linguagem de animação, à qual deve se dar mais atenção, já que ela tem sido bastante usada no teatro infantil.

O cenário de Carlos Alberto Nunes é um convite para uma encenação sutil e lírica. Tem suavidade e força para definir a proposta do espetáculo. Ao cenário se integram os belos figurinos de Ney Madeira e Kika de Medina, bem iluminados por  Aurélio de Simoni. Percebe-se a intenção do diretor de criar um espetáculo lírico, leve e ao mesmo tempo com força dramática, ainda que tal não se cumpra totalmente. Mas afinações, cortes, e o repensar sobre linhas de atuação podem fazer com que Riokay se transforme  num belíssimo espetáculo. O material é rico, as imagens são belas, e considerando o trabalho como um work in progress,  no final da temporada podemos ter um vigoroso espetáculo.