Crítica publicada no Jornal do Brasil
Por Eliane Yunes – Rio de Janeiro – 03.10.1987

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Felizes Surpresas

Se o teatro infantil na temporada de 1987 tem trazido felizes surpresas, se não tanto nos textos, ao menos nas montagens, algumas de primoroso acabamento, é verdade também que elas nem sempre são boas. O espaço do Planetário ilustra isto no momento, com as peças em cartaz em seus dois horários infantis.

Nada é mais equívoco que o projeto que envolve o texto e a encenação de A Revolta dos Bichos, de Manassés Sessanam. A falta de coerência se dissemina por todo o espetáculo, a começar por um robô narrador, que entra e desaparece sem dizer a que veio. A história, descosturada, mistura poluição do homem, disputas entre bichos, umas tolas, outras inteiramente desgastadas, e a procura de um “culpado”, réu já conhecido e irreconhecível pelas ações, com solução final de sua pior varinha de condão. Além disto, uma direção que torna primário o trabalho dos atores, sem orientação alguma sobre o que seja representação, festa escolar de final de ano faria melhor.

A defesa ecológica é meio pretexto para sequências desconexas, gritos e correrias que confundem a plateia e não produzem qualquer catarse em prol da natureza.

Para não perder a viagem, a peça seguinte, recém estreada, levanta o nível do teatro: Terra de Gigantes, uma peça de Vicente Pereira, sobre um roteiro de Ronaldo Resedá, recebeu de Alice Koenow um tratamento visual e uma direção que, inclusive, tornam a viagem de Neon, o menino que queria crescer, um percurso mais surpreendente do que sugere o texto.

Tirando partido da música de Mário Perelmann, a montagem privilegia a imagem com cenas mudas que aguçam o olhar do espectador para a leitura gestual. As sequências ágeis descartam qualquer monotonia, adjurada pelos figurinos excelentes, Amélia Nocera; e pelo bom trabalho de corpo, Josué Soares; e com bonecos, Fernando Sant’Anna, experiência que Alice já tivera em Fio de Linha. O roteiro de viagem do menino, Paulo Vignolo, em busca dos gigantes cruza a terra da fantasia ao lado de uma Sa-fada, Lucy Monetebello, aprendiz de magia que resolve os conflitos com poucas posições. Mas é na terra dos homens, esses gigantes desumanizados pela vida urbana atordoante e apressada, que o menino vive seus maiores riscos: o clima envolvente do consumo atordoa e exaure.

A descoberta de que todo homem pode ter um coração de gigante é um tanto gratuita, “revelação” da fada ao menino, mas isto se coaduna com o clima de sonho em que a história se desenrola, para evitar uma nova geração, baby lunática ou babilunática, em que o crescimento físico não acompanha o emocional.

Cortada por recursos cômicos inteligentes e contada de maneira ágil, a peça diverte e, curiosamente, em uma cena, faz mais pela defesa da natureza, sem opô-la maniqueisticamente ao progresso, em toda a proposta do horário anterior.

Lúdica, a peça é um convite à reflexão.