A peça conta o amor de duas meninas, sem chocar e sem discursar. Foto: Alexandre Krug

Os atores alternam-se na interpretação de todos os personagens

Crítica publicada no Site da Revista Crescer
Por Dib Carneiro Neto – São Paulo – 05.08.2016

Barra

Menina com menina no teatro para crianças

Espetáculo infantil, em São Paulo, aborda de forma pioneira no horário vespertino o tema do afeto entre duas garotas

Uma princesa está prometida para o príncipe, pois disso depende a união de dois reinos. Até aí, tudo bem: isso é típico, nos mais famosos contos de fadas universais. Mas eles são mais amiguinhos do que namorados. Quando a princesa vai experimentar seu vestido de casamento pela primeira vez, uma grata surpresa acontece, algo como um desvio na rota da fábula: ela e a jovem costureira se encantam uma pela outra, descobrem afinidades, conversam por horas, enfim, por que não dizer?, elas se apaixonam.

Sim, não se espante. Sinal dos tempos. Isso é um enredo de peça infantojuvenil, em cartaz até setembro no Centro Cultural São Paulo. O competente espetáculo, A Princesa e a Costureira, a cargo do grupo Teatro da Conspiração, de Santo André, é baseado no livro homônimo da psicóloga Janaína Leslão – o primeiro livro infantojuvenil brasileiro que trata sobre o amor entre duas mulheres.

Tudo é abordado de forma delicada e com muito bom gosto. A adaptação do texto, a cargo de Solange Dias, e a direção de Antonio Correa Neto caminharam de mãos dadas rumo ao objetivo de contar uma boa história, sem chocar, sem discursar. Sem militâncias nem exageros. Em essência, você estará levando seus filhos para verem juntos uma peça bastante agradável sobre as múltiplas possibilidades de afeto entre pessoas. Não é demais?

Uma incrível sacada da montagem é fazer os três atores do elenco (Erika Coracini, Marcio Ribeiro e Mariana Sancar) alternarem-se na interpretação de todos os personagens, num jogo cênico que sugere a necessidade de nos colocarmos no lugar do outro para entender as diferentes formas de ser de cada um. Sobretudo em uma peça com essa temática homossexual, esse lance da alternância resulta muito inteligente e até fundamental no combate ao estranhamento, ao preconceito. Na primeira vez em que o ator diz que quer ser a princesa, as duas atrizes se espantam – e ele pergunta: “Por que não? Só porque sou menino?”

Conversei com o diretor da peça, Antonio Correa Neto, que me disse: “O mais importante é salientar que o amor homoafetivo não é o assunto principal do espetáculo, mas por meio desse viés são discutidos a diversidade, a tolerância, a fraternidade, o medo da exclusão, a solidariedade. São questões contemporâneas que precisamos discutir, todos, inclusive as crianças, se quisermos um mundo melhor já! E nós queremos.”

Formada dentro do Núcleo de Montagem da Escola Livre de Teatro de Santo André e com mais de 15 anos de trajetória, a companhia Teatro da Conspiração tem em seu repertório espetáculos adultos e infantis, além de atividades relacionadas à contação de histórias. A temporada de A Princesa e a Costureira dá prosseguimento ao projeto do CCSP sobre Arte e Sexualidade, que se iniciou no ano passado. Haverá um encontro, no dia 19 de agosto, aberto ao público, com a presença da equipe da peça e de uma debatedora convidada, a crítica de teatro infantil Mônica Rodrigues Costa. A autora do livro, Janaína Leslão, estará no segundo debate, no dia 27 de agosto, quando também entrará em cartaz a mostra de fotografia ‘Gênero, direitos sexuais e cidadania de mulheres lésbicas e bissexuais’, uma parceria com a Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres (SMPM).

Serviço

Centro Cultural São Paulo – Sala Jardel Filho
Rua Vergueiro, 1.000, Liberdade – São Paulo
Tel. 11 3397.4002
Sábados e domingos, às 16h
Ingressos a R$ 20 (inteira)
Em cartaz até 4 de setembro de 2016