Priscila Camargo: habilidade de contadora e talento de atriz


Crítica publicada no Jornal do Brasil 
Por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 12.08.2006

 

 

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Histórias muito bem contadas

Em A  Polegarina e Outras Histórias, Priscila Camargo apresenta sob a direção de Cacá Mourthé, três contos inspirados em  Hans Christian Andersen: A Polegarina, Este Meu Velho Sabe o que Faz e O Rouxinol do Imperador da ChinaPolegarina é uma versão do Pequeno Polegar, a partir de numa visão feminina do pequeno herói, conhecido personagem dos contos tradicionais. Esta versão narra do nascimento ao casamento da heroína com um príncipe encantado.

Este Meu Velho Sabe o que Faz é outra conhecida história, em que se fala do homem que sai de casa com um cavalo para fazer negócios e que volta com um saco de maçãs podres. Evidentemente, como todo conto de Andersen, traz um ensinamento.

A última história, O Rouxinol do Imperador da China, é uma  das mais conhecidas do escritor dinamarquês. Fala sobre um pássaro encantado que pertence ao imperador, que se confronta com um pássaro mecânico, suscitando uma discussão bastante atual.

Em trabalhos anteriores, a atriz optou por uma excepcional mescla da linguagem narrativa com a teatral. Histórias de Mãe África é um exemplo desta rara habilidade da dupla Cacá Mourthé e Priscila renovar a linguagem oral cênica. No entanto, neste espetáculo, Priscila preferiu centrar o seu trabalho na arte de contar, por isso os elementos teatrais entram apenas como suporte à esse projeto.

Um grande baú em cena, com duas escadas laterais, bonecos e música ao vivo, compõem o universo do espetáculo. O cenário tem a assinatura de Chico Spinosa e cumpre sua função de dar estrutura física a atriz. Os figurinos, também de Spinoza, são uma referência, inicialmente, a uma das mais famosas histórias de Andersen, O soldadinho de chumbo. Mas a atriz conta suas histórias com um figurino que nos remete à oriental Sherazade das Mil e uma Noites, o que não se coaduna de forma plena com o universo de Andersen.

A luz de Aurélio de Simoni, lutando contra os poucos recursos do teatro, consegue, através de uma inteligente iluminação, em que se utiliza principalmente a luz branca, destacar os elementos importantes de cada história e a bela presença cênica da atriz. Priscila conta, canta e dança sob a direção musical de Renato de Resende. As músicas são tocadas ao vivo por Marcelo Daguerre, que contracena com a atriz.

A linguagem do teatro de formas animadas está em cena e, de todos os modelos utilizados, é o que mais deixa a desejar, não só em relação à confecção dos bonecos, mas quanto à própria manipulação. O uso dessa linguagem formas animadas requer um conhecimento e treinamento aprofundados para que possa mostrar toda sua magia.

Mas a grande atração, na verdade, é o domínio que Priscila Camargo tem do contar histórias, que se alia a sua formação de atriz, por meio de uma voz bem colocada, bem projetada, com uma dicção impecável e um forte carisma em cena.

Apesar da eficiência de toda a equipe de criação, trata-se de um trabalho autoral de Priscila, que assina as adaptações das histórias das histórias para serem contadas no palco, dando continuidade às suas próprias pesquisas. É um bom começo de temporada.