Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 04.11.1995
Um clássico definitivo
Criado em 1955, Pluft, o Fantasminha é, sem dúvida, o texto mais perfeito de Maria Clara Machado. Com uma estrutura simples, a história que reúne elementos da comédia de costumes, a trama de piratas, protagonizada por uma família de fantasmas, é o Ovo de Colombo que provavelmente deixa muitos autores imaginando como não tiveram essa ideia antes. Maria Clara saiu na frente e Pluft, nesses 40 anos de existência, ganhou o mundo, traduzido e encenado nos mais diferentes países. Sua volta ao Tablado em montagem comemorativa é um presente para pelo menos três gerações de público fiel ao fantasminha que tinha medo de gente.
Ambientado numa cabana de pescadores abandonada, Puft, sua mãe e o tio Gerúndio, um fantasma que vive a dormir em seu baú, tem o seu cotidiano abalado pela chegada de Maribel, a neta do Capitão Bonança, sequestrada pelo pirata Perna de Pau que vai em busca do tesouro deixado pelo avô da menina. A história a princípio linear, ganha contornos irresistíveis a partir das características de seus personagens. Ao contrário do que poderia se pensar, a família Fantasma tem problemas muito semelhantes aos do público que assiste ao espetáculo. A senhora Fantasma, não larga o telefone, mesmo nos momentos em que sua atenção é solicitada pelo filho. O tio Gerúndio, aposentado do emprego de fantasma de navio, perdeu o interesse pela vida, e se entrega facilmente ao sono. O senhor Fantasma, pai de Pluft, que quando vivo exercia a profissão de fantasma da ópera, não está mais na família. Virou papel celofane.
A ideia de transpor para a família Fantasma as característica comuns a todas as famílias, é um dos achados do texto. A curiosidade natural que as aventuras de piratas e de mocinhas que desejam ser salvas de seus malfeitores exercem sobre a plateia termina por fechar essa história que, mesmo sob protesto da autora, se tornou um clássico do teatro para crianças.
Pluft, o Fantasminha, em sua versão 95, tem como grande trunfo, além do texto irretocável a vitalidade de Maria Clara Machado na direção. Os detalhes que enriquecem a encenação, como por exemplo, só Pluft atravessar a imaginária parede da casa enquanto os personagens seguem o caminho normal de entrada e saída, ou as cenas movimentadas em que o fantasminha apaga sem cessar todas as velas acendidas pelo capitão Perna de Pau, são alguns dos toques de genialidade da diretora em plena ação.
O elenco, formado por alunos e ex-alunos do Tablado, está bem à vontade em seus papéis. Dida Camero, que já foi a coruja Sofia, se destaca dos demais compondo seu personagem – a mãe fantasma – com calculado humor. Também em sintonia com o texto está o trio de marinheiros formados por Marco André (João), Maurício Lobato (Julião) e Marcelo Paulo (Sebastião). Mariana Oliveira, porém, exagera no tom pesado e sinistro que dá a Pluft, principalmente na primeira parte do espetáculo.
A bem-cuidada montagem tem ainda cenários da artista plástica Anna Letycia, inspirados nos de Napoleão Moniz Freire para a estreia em 55. Os figurinos de Kalma Murtinho, que também assinava os da primeira encenação, ganharam novos adereços e bordados, sem, no entanto enfeitar além do necessário a naturalmente esvoaçante silhueta da família Fantasma. A iluminação de Jorginho de Carvalho e a trilha musical de Ricardo Mansur são bem vindas interferências nesse espetáculo que, além da plateia já conquistada, está em cena para angariara muitos outros fãs.
Cotação: 3 estrelas (Ótimo)