Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 05.07.1980

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Os adolescentes

Pequeninos, mas Resolvem peça de Lícia Manzo, em cartaz no Teatro do Planetário, é um espetáculo criado e realizado totalmente por adolescentes. A autora do texto tem 15 anos, o elenco é todo adolescente e a direção é coletiva. É indiscutível o valor do trabalho desses jovens no que se refere a uma postura em relação à profissão que desejam exercer. Enquanto muitos profissionais (já calejados e sofridos) pensam dez vezes antes de se lançarem na misteriosa aventura de produzir um espetáculo teatral, esse grupo de jovens (ainda não calejados e sofridos; por isso mesmo com mais energia e menos questionamentos) se reúne, escreve, monta e produz uma peça, alugando um teatro e disputando o mercado com profissionais mais experientes. E o resultado comercial parece ser bom, apresentando um público bastante satisfatório.

A pouca idade e a pouca experiência, entretanto, deixam marcas visíveis e o espetáculo, apesar de indiscutível alegria de representar do elenco, deixa bastante a desejar. A direção coletiva já é difícil de ser realizada com profissionais experimentados; com iniciantes, as dificuldades se multiplicam. Fica faltando a Pequeninos, mas Resolvem uma clareza narrativa; a noção de síntese; a criação de uma ação dramática que substitua os infindáveis e repetitivos diálogos. E, falta, também, uma ligação entre uma cena e outra, entre um assunto e outro, para que a peça não fique tão descosida.

Falta também uma posição crítica em relação ao texto. Tanto a autora como o elenco, na intenção de fazer uma peça que seja um hino à vida e que, ao mesmo tempo, leve a plateia a concluir que os aspectos negativos deste mundo podem ser mudados, não se perguntaram se essa peça seria o melhor caminho para esse recado. Enquanto o espetáculo mostra claramente a pequena experiência teatral do grupo, é no texto que se percebe a pequena experiência de vida (não só da autora, mas também do grupo, que endossou amplamente). A peça deixa subentendido que, cortando as notícias ruins dos jornais, os acontecimentos negativos que originaram tais notícias também deixariam de acontecer. Pelo contrário, quanto menos noticiados, mais proliferam os fatos negativos. A peça mostra um diretor de jornal que se revolta porque não há mais crimes – exatamente quando vivemos um momento de grande violência urbana. A peça mostra que as crianças invadem um jornal, enganam com uma facilidade extrema o diretor e o repórter e, apesar de não terem qualquer experiência, fazem um jornal inteiro para o dia seguinte, só com notícias boas. Esse jornal é rasgado – rasgar um, no caso, significa rasgar toda uma edição (!) – e, ainda se consegue tempo para refazê-lo (!).

Ao final, eles afirmam que isso tudo e faz de conta, e que a plateia pode mudar as coisas de verdade. Mas, se a plateia for levar em consideração os dados que recebe do palco, com tudo se resolvendo de modo tão falso e tão falho, aí o mundo continuará como sempre, eternamente amém. A destacar o trabalho do ator que interpreta o “repórter”: muito engraçado, com bom tempo de comédia, com boas variações de ritmo e de tonalidades.