Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 19.03.1975
Pedro e o Lobo
“Um conjunto de equívocos, apesar das boas intenções” – essa, talvez seja a melhor definição para Pedro e o Lobo, espetáculo recém – estreado no Teatro de Bolso. Os equívocos começam pelo texto de J. A. Santa Rosa: o autor, na tentativa de criar uma peça educativa e moralizante, consegue apenas fazer um texto com pouca ação e muitos conceitos; e tais conceitos são muito duvidosos: sempre acontece uma coisa ruim ao mentiroso; o menino desobediente, porque não ouviu os conselhos da mãe, foi apanhado pelo lobo; Um menino que tira doce escondido pode ser um menino valente? E etc., etc. Logo após afirmar que agente não deve denunciar os amigos (e os inimigos?) o avô influencia a plateia a denunciar Pedrinho. A peça não tem atrativos e se desenvolve sem interesse. Mas seu pecado maior é não contar com a incrível capacidade de fantasia da criança. Assustando-a desnecessariamente quando o ator fala de modo agressivo: “Isso aqui não é um teatro; é um zoológico. As crianças estão todas presas. Olhem para trás: as portas estão fechadas! As crianças estão presas!”.
A direção Jayr Pinheiro não consegue vencer as deficiências da peça. Ela assume o texto integralmente e a encenação só faz tornar ainda mais claras a s deficiências da obra. Em consequência, a montagem também é sem interesse, inexpressiva, equivocada. Além deste erro de enfoque (achar que a peça é boa), o principal defeito de Jayr Pinheiro volta a ser a direção de atores. Apesar de ter conseguido fazer com que o elenco entendesse o texto, o diretor ainda não foi capaz de se livrar de uma linha de interpretação totalmente exteriorizada e ainda na fase dos pulinhos. Além disso, as marcas se repetem durante todo o desenrolar da peça, limitadas a um pra-lá-e-pra-cá e a utilização do já mais que batidíssimo recurso de levar o ator até a plateia. Não há preocupação com uma marca que – além de eficaz – tivesse também valor estético. A exceção fica por conta do início do segundo ato, onde a luz negra, a música, o figurino e a dança conseguem se harmonizar e criar um momento teatralmente rico.
O elenco tem como qualidade principal, o fato de informar com eficiência as ideias do texto. Mas o seu comportamento é falso, superficial, estereotipado. Os atores não trabalham com verdade e nem com emoção, e seus personagens não merecem credibilidade em momento algum. Destaca-se Renato Castelo (Puck), que não consegue vencer a dificuldade que é interpretar sem texto, mantendo-se vivo, atento, expressivo, com uma utilização maliciosa dos olhares e com bom jogo de expressões faciais. Ele é o responsável pela melhoria do ritmo da peça dando-lhe um novo impulso, um novo vigor. O ator precisa, apenas, cortar um pouco os gestos: são gratuitos e vão perdendo a força à medida em que se repetem. O cenário de Bass Oliveira é artisticamente pobre e ainda é da fase do telão pintado: não há o mínimo compromisso com as mais contemporâneas pesquisas da cenografia (um dos atores que mais se desenvolveu no espetáculo teatral). É quanto aos figurinos de Delmar Morais, há apenas uma preocupação de ordem prática, mas sem nenhum resultado estético.
Pedro e o Lobo nos mostra uma peça fraca, uma direção que assume as falhas do texto e um trabalho de interpretação superficial e exteriorizado. E o teatro infantil já está começando a sofrer, na carne, as consequências de seu comportamento equivocado: as montagens há algum tempo, passaram a se caracterizar pela exigência de que as crianças respondessem – sempre aos berros – às perguntas artificiais criadas para uma falsa participação. (“Tá fraco! Mais alto! Tá fraco!”). Agora, como se vê no Teatro de Bolso, são os gritos da gurizada que atrapalham o espetáculo: o teatro infantil, ao invés de formar um público educado, esta criando, apenas, macacas de auditório.
Recomendações da Coluna:
Sem restrições: História de Lenços e Ventos (última semana)
Com pequenas restrições: Você Tem um Caleidoscópio?; A Viagem do Barquinho e A Varinha do Faz de Conta.