Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Macksen Luiz – Rio de Janeiro – 15.09.1994
Simpático Jogo Cênico
O teatro do francês Jean Tardieu é feito de situações que revolvem questões de linguagem. A palavra adquire um caráter de representação do real, já que se estabelece em suas peças curtas um jogo dramático em que o que é dito assume forma quase cênica. Em Os Amantes do Metrô, Tardieu trata essencialmente da sonoridade da palavra, estabelecendo uma relação entre o encontro amoroso e a urgência da circulação em um trem de metrô.
Na verdade, o autor impõe uma sucessão de situações, algo fortuitas, que mostram a dificuldade de aproximação entre um casal. A trama em si é quase uma sugestão. O que prevalece, efetivamente, é o tratamento que Jean Tardieu dá ao uso da linguagem. O ritmo que se imprime à palavra é o verdadeiro condutor desse fio dramático. Os trocadilhos e os jogos verbais, que a tradução de Renato Icarahy recria muito bem em português, servem ao diretor (o mesmo Icarahy) como pretexto para desenhar sua encenação.
O espetáculo é marcado pelo ritmo de um metrônomo. Os atores contam em números as suas pausas, se movimentam em compassos de um ritmo repetitivo e falam com a batida de um som constante. Esse aspecto rítmico de Os Amantes do Metrô possibilita ao diretor Renato Icarahy marcar formalmente o espetáculo como uma valorização cênica da palavra. É um aspecto essencial da dramaturgia de Jean Tardieu, que o diretor soube trazer à frente da sua montagem. Por outro lado, essa mecanização retira um frescor e uma leveza do texto que, de certa maneira, compromete a fluidez da encenação.
O aspecto de desumanização da vida urbana, implícito na atitude das personagens, não chega a ser um peso dramático para o espetáculo. Outros aspectos decorrentes desta desumanidade, como a solidão, a atomização e a perda da identidade, acabam por ganhar no espetáculo de Renato Icarahy uma força cênica maior do que a mera insinuação presente na peça.
Os cenários e figurinos de Lídia Kosovski e Ney Madeira interpretam bem a ideia de mecanicismo. A iluminação de Aurélio di Simoni também acentua esta atmosfera. Do elenco, Anna de Aguiar e Raul Serrador, como o casal que busca se reconciliar no metrô, têm mais oportunidade de personalizar suas atuações. Os demais, Carmem Leonora, Dayze Pozatto, Fábio Tubenchlak, Mário Mendes, Nilvan Santos e Teresa Frota, compõem um quadro interpretativo fixado em marcações tão rígidas que se mostram quase como um simples cenário humano.
Os Amantes do Metrô, ainda que perca um pouco do brilho efêmero do texto e acentue um lado um tanto sombrio, mostra uma criteriosa interpretação de um jogo de palavras, que o diretor transforma num jogo cênico extremamente simpático. Um divertimento inteligente para o horário do almoço.
Os Amantes do Metrô está em cartaz no Teatro II do CCBB, de quarta a sexta-feira às 12h30.
Ingressos a R$ 2.
Legenda da foto: Peça de Jean Tardieu é boa diversão na hora do almoço.