Matéria publicada no Jornal Tribuna de Imprensa
Por Rodrigo Farias Lima – Rio de Janeiro – 20 e 21.12.1987
O Teatro Infantil perde seus críticos
Estão em cena, nos teatros da cidade do Rio de Janeiro, cerca de 40 peças para crianças. é o número normal, aliás, demonstrando que o gênero, apesar de todas as dificuldades que enfrenta (sequer dispões de casa própria, sobrevivendo como hóspede indesejado do teatro para adultos) tem o seu público e constitui atividades que mobiliza considerável número de artistas e técnicos.
O que já não é tão normal é a porcentagem de espetáculos de falta de qualidade em cartaz. No mínimo – e correndo o risco de cometer injustiças por omissão – poderíamos arrolar umas sete peças de nível surpreendente. São elas: João e Maria, adaptação de um conto popular fielmente transposto para o palco (Teatro Laura Alvim). O Gato de Botas, musical com direção e texto de Maria Clara Machado (Teatro Tablado); De Repente… no Recreio, mostrando com admirável senso poético o desabrochar da afetividade no mundo pré-adolescente (Teatro dos Quatro); Palhaçadas, texto de João Siqueira, dirigido pelo sempre brilhante Tônio Carvalho (Casa de Cultura Laura Alvim); Um Peixe Fora D’Água, musical de sura Berditchevsky, tão rico em termos de linguagem teatral como o do ponto de vista plástico (Teatro Villa Lobos); Sonhe com Ratinhos, texto e direção do promissor Ricardo Maurício (Teatro Ipanema); e Telefone sem Fio, de Denise Crispun, sobre um menino que, tendo sofrido perda afetiva, supera pelo imaginário o terror da solidão e da morte (Teatro Cacilda Becker).
Há muitos outros textos assinados por nomes significativos, de Ziraldo a Lúcia Miguel Pereira. E naturalmente, como sempre acontece, mais dois textos de Maria Clara Machado (esta nossa autora de prestígio mundial) em cartaz: Camaleão na Lua (Teatro américa) e O Rapto das Cebolinhas (Teatro Moacyr Bastos), em Campo Grande e que só não incluímos na lista das sete recomendações porque não tivemos a ocasião de ver.
Em resumo: há artistas trabalhando bem e algum público consumindo. Público que só não é maior porque, ultimamente, a grande imprensa resolveu esquecer o teatro infantil. O espaço que resta é o roteiro aos sábados e domingos, Só. Crítica, que é da maior relevância tanto para o público como para os artistas, desapareceu. Os dois críticos que ainda estavam em atividade foram dispensados. E atualmente é difícil, quase impossível, formar uma comissão julgadora para atribuir os prêmios anuais.
Está correndo uma abaixo-assinado nos teatros, para ser encaminhado aos diretores de jornais. Não é justa a situação que se criou, porque, pela falta de opinião crítica, muitos espetáculos de qualidade estão, à partida, correndo o risco de perderem a vez para montagens medíocres ou até para simples picaretagens, que também não faltam no teatro infantil. E isto é ainda mais doloroso porque os pais nem sempre sabem escolher por si mesmos e são capazes de levar suas crianças à primeira Branca de Neve ou Cinderela que estiver pintando no teatro mais próximo lá de casa.
Juntamos aqui o nosso protesto ao que a classe está formulando. É urgente reconquistar, nos jornais, o espaço de que o teatro infantil já dispôs e sem o qual seu futuro é o da falência. Ou da extinção.