O Teatro e os (Des)Caminhos da Política Cultural Pública Carioca

Em janeiro de 2003, a classe teatral da cidade do Rio de Janeiro foi surpreendida por uma série de novas propostas de política cultural anunciadas pelo então prefeito César Maia. Escancaradas na capa do segundo caderno do jornal O Globo estavam lá às novas diretrizes que iriam nortear os rumos da produção teatral carioca. Causaram um grande choque a radicalidade das proposições anunciadas e, principalmente, o teor equivocado que orientava a política a ser implementada, como denota, por exemplo, a infeliz declaração do César de que a programação teatral do Rio de Janeiro deveria ser regida por parâmetros da Broadway, ou melhor, em suas próprias palavras, o objetivo passaria a ser: “mais Broadway e menos Off-Broadway”.

Bem, imaginem, a classe entrou numa comoção só, a indignação tomou conta de todos (ou quase todos), não se ouvia falar em outra coisa, tamanha era a perplexidade diante de um prefeito que ousava direcionar a política cultural do Rio tendo como modelo a Broadway. Lógico que ele estava com isso propondo que o investimento do governo fosse direcionado para uma programação mais comercial e não para a investigação de linguagem cênica. Engraçado que nenhum dos assessores do então prefeito o orientou explicando-lhe que a Arte não é modelar, e que a tentativa de padronizar as iniciativas artísticas a partir da cultura norte-americana era no mínimo vexaminosa e colonialista. Conto esse triste fato da trajetória do panorama cultural carioca porque um ninho preconceituoso ali existente encontrou eco e espaço para ser difundido e explorado. A classe caiu no equívoco de produzir e alimentar um embate calcado em uma dualidade simplista – teatro rico e teatro pobre – como se o teatro comercial fosse o primeiro e o de pesquisa de linguagem o outro, e muitos foram os disparates publicados.

O bom disso tudo é que a classe se articulou novamente, depois de muitos anos em silêncio e nasceu, aí, o Fórum das Artes, que durou de janeiro a outubro de 2003 e de onde surgiram dois importantes núcleos atuantes até hoje: AGC – Associação de Grupos e Companhias de Teatro do Rio de Janeiro, e a APTR, Associação de Produtores Teatrais do Rio.   Muitas outras associações se fizeram presentes – como o CBTIJ, Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e Juventude, a COMCULTURA, Comissão Estadual dos Gestores Públicos de Cultura, a FETAERJ, Federação de Teatro Associativo do Estado do Rio de Janeiro, o SATED, Sindicado dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversão, a SBAT, Sociedade Brasileira de Autores Teatrais, entre outras -, contribuindo com suas experiências para o aprofundamento dos debates e para a reflexão sobre as questões de urgência que pulsavam naquele momento.  Lembrando que César Maia também havia criado por decreto o cargo de gestor da Rede Municipal de Teatros, entregue a Miguel Falabella, destituindo todos os diretores das salas da prefeitura, bem como extinguindo o RIOARTE. Aliás, naquele ano, o programa de bolsas do RioArte foi anulado, mesmo já tendo sido concluído, pela comissão julgadora, o processo de avaliação da primeira etapa. O golpe era claramente populista: o prefeito alegou que todos os ganhadores tinham “CEP da Zona Sul” e, segundo ele, uma nova comissão julgadora seria constituída para distribuir proporcionalmente as bolsas não por mérito, mas por zonas da cidade…, o que não foi feito: na realidade o programa de bolsas foi simplesmente extinto.

No Fórum, os artistas se empenharam em discutir as questões emergentes, e refletir sobre a importância de se ter uma política cultural mais efetiva e consistente no Rio. Buscaram também bases comuns para constituírem um coletivo potente e preparado para atuar politicamente na sociedade, produzindo seminários no intuito de embasar a classe teatral para que esta pudesse interferir com mais precisão nos rumos da política cultural pública nas instâncias estadual, municipal e federal. Os seminários contaram com a presença de Luis Carlos Prestes, Yacoff Sarkovas, Marta Porto, Aimar Labaki, Lia Rodrigues, entre outros. A idéia era que a classe pudesse apontar caminhos comuns, que dessem conta da diversidade dos modos do fazer teatral (para além de clichês simplistas e equivocados), para a realização de uma ação mais efetiva e assertiva de acordo com a realidade do panorama artístico do Rio. Isso também foi motivo de muitas controvérsias, pois havia uma ala de artistas no Fórum que defendia uma ação imediata e outra que preferia buscar um maior embasamento através de discussões e seminários para depois agir.

Conquistas alcançadas nessa época – como, por exemplo, o recorte de verba para grupos e companhias no edital da prefeitura – FATE, Fundo de Apoio ao Teatro -, já fazem parte do passado, pois a tendência no Rio, infelizmente, é o culto à efemeridade, por parte da mídia e por parte das autoridades, e ainda hoje não conseguimos criar e aprovar uma lei que garanta aos artistas e à sociedade carioca uma produção cultural diversificada, democrática e continuada.

Com o governo Lula tivemos uma abertura importante com a instância do poder federal e muitos foram os seminários (Cultura para Todos) que a equipe de Ministério realizou com associações artísticas organizadas de todo o Brasil. Lembro-me da agradável sensação que senti ao participar de uma vídeo-conferência promovida pela Funarte, na época presidida por Antonio Grassi, que envolveu vários estados e na qual artistas de todo o Brasil tinham voz. Foi emocionante. A União das entidades do Rio (várias associações já citadas e outras mais) participou de todas as convocações e reuniões e vem trabalhando desde então para a criação de uma política cultural mais efetiva. Mas hoje, infelizmente, os caminhos para a implantação de uma política pública significativa ainda não foram trilhados. Importantes editais – federais, estaduais e municipais -, por falta de verba, encontram dificuldades para sobreviver e se manter nos prazos estabelecidos. A entrada de Jandira Feghali na Secretaria Municipal de Cultura gerou a expectativa de que a Rede Municipal de Teatros ganhe novo fôlego, se não se enredar em desvios burocráticos. Torço para que as Secretarias Estadual e Municipal de Cultura do Rio possam dar conta da pluralidade e da riqueza da produção cultural carioca.

Para finalizar, apresento o manifesto produzido em janeiro de 2009 pela AGC.  Depois, seguem outras visões sobre o panorama da política cultural no Rio, com dois artistas que são referência para a classe artística carioca, Dudu Sandroni e Antonio Carlos Bernardes.

Ana Kfouri
Diretora da CTM – Cia Teatral do Movimento, atriz, mestre em teatro pela UniRio e membro da AGC – associação de grupos e companhias de teatro do Rio de Janeiro

Reinventando a Pólvora

O Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e Juventude – CBTIJ,  já estava com cinco anos quando a “crise” se instalou na Secretaria de Cultura do Município do Rio de Janeiro. Era uma das poucas entidades, até então, que funcionavam a pleno vapor, organizada e com vários projetos sendo realizados. Inclusive, já tínhamos realizado um Seminário Internacional com a participação de mais de vinte países. O CBTIJ é uma entidade criada em 1998 quando, na realização de um Seminário, os profissionais constataram a necessidade de uma organização que cuidasse dos interesses dos profissionais que trabalham em Teatro para Crianças e Jovens.

O Teatro profissional para crianças comemorou no ano passado 60 anos, pois foi em 1948 que estreou O Casaco Encantado, de Lúcia Benedetti, realizado pela Companhia Artistas Unidos de Henriette Morinaux. E, por uma conquista do CBTIJ, comemoramos este ano no dia 20 de Março a oficialização do Dia Nacional do Teatro para a Infância e Juventude, pela lei 11.722 de 2008.

Mas voltando à crise.

Nosso ex-prefeito queria que o Rio se tornasse uma Broadway. Com exceção de dois grandes musicais no Teatro Carlos Gomes, financiados pela própria Secretaria, a Broadway não aconteceu. Aliás, não aconteceu quase nada. A RioArte foi extinta. O trabalho realizado pela ONG Palco Social, de Ernesto Piccolo e Rogério Blat, no Teatro Ziembinski (já haviam sido expulsos do Calouste Gulbenkian) foi sumariamente interrompido, com a desculpa que a Tijuca merecia coisa melhor. O resultado apenas desse teatro é que dois anos depois a prefeitura anunciava que estava dando uma última oportunidade ao Ziembinski, pois o plano maravilhoso que lá fora instalado não havia dado certo. Também acabou com o Prêmio Maria Clara Machado, que já acontecia há dois anos, e com o FATE – Fundo de Apoio ao Teatro, que foi sendo reduzido ano a ano.

O Fórum criado naquele momento, em virtude do anúncio do novo gestor, e que durou quase oito meses, conseguiu que três entidades fossem criadas: Grupos e Companhias, de Iluminadores e de Produtores. Mas, a razão principal ao estabelecer o Fórum seria a criação de uma lei, nos moldes da Lei de Fomento de São Paulo, e isto não foi concretizado.

Espertamente, o Secretário começou a dar um “cala-boca”, deixando algumas pessoas em seus cargos ou dando outros para algumas que protestavam e eram importantes dentro do Núcleo de Organização do Fórum, o que gerou uma desmobilização.

Com o surgimento das Câmaras Setoriais, o Rio de Janeiro criou informalmente, em 2006, a União das Entidades Teatrais do Rio de Janeiro, que tinha como objetivo ações conjuntas de interesse comum. Ainda hoje, com intervalos cada vez maiores, estas entidades se reúnem. A última ação conjunta é a luta contra a modificação do Super Simples para as Artes Cênicas, que aumentou os impostos em mais de 12%. Infelizmente, participar de uma luta comum é muito difícil. Muitas vezes, o ego de alguns responsáveis por estas entidades faz com que as lutas sejam mais por interesses particulares do que da coletividade.

Temos a necessidade cada vez maior de nos unirmos. Pode parecer um “slogan” antigo, gasto. Mas só a união entre os profissionais das Artes Cênicas e principalmente de nossas entidades fará com que conquistemos o que ainda precisamos conquistar.

E não basta conquistar. Temos que estar sempre atentos, pois infelizmente a cada novo governo sempre chegam àqueles que querem reinventar a pólvora, por tudo abaixo e achar que tudo deve ser refeito.

Antonio Carlos Bernardes
Secretário do Conselho de Administração do CBTIJ – Gestão 2008/2010

A Vanguarda Carioca

No momento que escrevo este artigo estou em Sampa, em ensaios, integrando o elenco do espetáculo A Noviça Rebelde, com estréia marcada para o dia 20 de março. E daqui, do quarto do hotel onde estou hospedado, folheando a Folha e o Estadão, me dou conta da imensa vitalidade do teatro carioca nesse momento. Estamos pousando em São Paulo, com um cardápio bastante representativo da nossa produção: da super produção ao experimentalismo, dos monólogos “sérios” ao stand-up-comedy. A Noviça Rebelde, Beatles Num Céu de Diamantes, Sassaricando, Doce de Leite, A Mulher que Escreveu a Bíblia, A Alma Imortal, Homemúsica, Ele Precisa Começar, ZÉ – Zenas Improvisadas, O Processo, Nu de Mim Mesmo e, em abril, Sete – O Musical e As Centenárias incrementam a temporada. Parece que temos aqui uma boa mostra do teatro carioca e da sua pluralidade.

Durante muitos anos, coube quase que exclusivamente ao SESC SP a tarefa de trazer espetáculos cariocas a essa cidade. Muitos dos espetáculos citados cumprem temporada nos teatros e salas dos Sesc’s espalhados pela cidade e têm dado conta de atualizar as platéias e crítica paulistas sobre a produção dos grupos e espetáculos que não poderiam sobreviver da bilheteria. Um trabalho fundamental que esperamos, melhor ainda, necessitamos, que continue. Portanto, a novidade aqui parece ser o teatro de entretenimento ou comercial ou empresarial, enfim, as grandes produções, que ocupam as salas particulares, cobram os ingressos mais caros, receberam verbas privadas via Lei de incentivo, notadamente via Lei Rouanet. Elas sempre estiveram presentes por aqui, mas nunca na intensidade desta temporada. E, devo dizer, são essas produções que estão fazendo a diferença.

Em primeiro lugar é preciso entender e reconhecer que o dito “teatrão”, ou o teatro comercial, voltou a preocupar-se com a qualidade artística daquilo que estava sendo apresentado ao seu público. Os clássicos voltaram a freqüentar as salas cariocas, tanto os internacionais (Shakespeare, Pirandello, Harold Pinter, Ibsen), quanto os nacionais (Vianinha, Chico Buarque e Paulo Pontes, Dias Gomes); produções vultosas apostam na nova safra de dramaturgos como Daniela Pereira de Carvalho, Eduardo Rieche e Newton Moreno; jovens atores e autores encontram espaço nos grupos e em comédias do pós-besteirol, no stand-up-comedy e nos jogos de improvisação levados a cena. De 2005 para cá, pelo menos cinco novas salas particulares foram abertas: o Teatro Poeira, o Solar de Botafogo, o OI Casa Grande, a sala Tônia Carrero e o Teatro Fashion Mall.

Mas é na maturidade do advento dos musicais, representada pelo enorme sucesso alcançado pelos espetáculos assinados por Charles Müller e Claudio Botelho, que podemos traduzir da melhor forma esse momento.  Em primeiro lugar para se fazer um bom musical é preciso que os atores saibam cantar bem. Essa afirmação parece óbvia, mas não é. Isso por que, infelizmente, no caso do teatro, o sujeito pode não ser ator, pode não ter aprendido a técnica da arte de representar mas, ainda assim, pode subir ao palco e fazer uma peça, pode gravar uma novela na televisão e pode mais, encontrar o sucesso, mesmo que efêmero. No musical não. O fulano pode até não saber interpretar, não ser “ator”, mas tem de saber cantar ou não vai fazer o espetáculo. O coreógrafo tem de saber de dança, o diretor musical tem de ser músico. Isso impõe de cara uma limitação que garante um certo nível de exigência para que a produção aconteça. (Isso é apenas uma equação teórica pois, felizmente, o nosso mercado esta repleto de atores que cantam muito bem e cantores que interpretam com sofisticação. Estou escrevendo “ator”, “cantor”, no masculino, no sentido do gênero mas, para se fazer justiça, teria que escrever “atriz”, “cantora”, pois são elas as grandes divas impulsionadoras dos musicais!). Repito: esse raciocínio parece óbvio mas não é. Ele nos aponta para o profissionalismo na nossa atividade que “dançou” durante um bom tempo. E ele nos aponta para a necessidade de fortalecermos as vias pelas quais esse profissionalismo se dá: pelas escolas de formação, sejam elas escolas mesmo, melhorando ainda mais a relação entre o universo acadêmico e o movimento teatral; pelos grupos de teatro, que além das experiências estéticas e artísticas, são responsáveis, não só pela formação, mas também, pela transição entre escola e mercado, como a história pode comprovar.

Outros fatores levaram o teatro musical a busca do “bem-feito”. Nossa tradição da boa música associada ao teatro nos remete ao encontro de Tom e Vinícius em Orfeu da Conceição nos anos 50, e indo mais longe, ao Teatro de Revista, do fim do século retrasado, pois, na falta do rádio, da TV, do disco, era através do teatro que os compositores tinham suas musicas difundidas, a começar por Chiquinha Gonzaga, fundadora da SBAT – Sociedade Brasileira de Autores Teatrais. No Rio de Janeiro, a partir dos anos 70, tivemos uma escola de diretores musicais, do mais alto nível, iniciada pela músico-pedagoga Cecília Conde, no Conservatório Brasileiro de Música; ou mesmo vindo da tradição do teatro infantil, onde a música é quase obrigatoriamente presente, de Maria Clara Machado e sua parceria com o compositor Ubirajara Cabral, responsável por um punhado de clássicos inesquecíveis como o tema principal de Tribóbó City. Daí surge uma geração talentosíssima trabalhando para o teatro: Luiz Antonio Barcos, Marcos Leite, Caíque Botkay, Eduardo Dusek, Tim Rescala, David Tigel, entre outros. (Não vou citar nomes da estupenda safra de compositores e diretores musicais surgidos a partir dos anos 90 para não cometer injustiças esquecendo o nome de alguém). Finalmente, a Broadway e a riquíssima tradição do teatro musical americano e de suas canções universais – as maiores referências do teatro musical contemporâneo – também estabeleceram um paradigma a ser alcançado, cobrado por crítica e público e, por que não, por artistas e produtores.

Nesse sentido, as quatro peças que a dupla Müller & Botelho apresentam agora em São Paulo são exemplares disso tudo: a Noviça Rebelde, Beatles num Céu de Diamantes, Sassaricando e Sete – o Musical (estréia em abril), têm em comum o enorme zelo da produção, a alta qualidade de seus intérpretes e músicos, e revigoram a tradição da música brasileira (Sassaricando) e do teatro musical da Broadway (A Noviça), inovam a linguagem e a dramaturgia do “musical brasileiro” com Sete – o Musical e, em Beatles, transformam a música em cena, sem texto.

Alguns descrentes chatos poderão dizer: Mas com dinheiro é fácil! Dois equívocos: o primeiro, se refere à grana que, mal utilizada, pode redundar num enorme fracasso, e o segundo, é que nem sempre foi com dinheiro que os produtores e artistas ligados ao teatro musical trabalharam. Tem uma história de pelo menos 15 anos que foi trilhada  não só pelo Charles e pelo Cláudio, mas por tantos outros artistas, diretores, dramaturgos, músicos, atores e produtores que batalharam muito para se chegar a esse nível!

Outro fato curioso: o teatro musical se livrou da obrigação de ter uma estrela da televisão no seu elenco, item quase obrigatório para uma produção que pretendia disputar o mercado, tanto do patrocínio como do público. E com isso, criou-se outro bom paradigma para a produção teatral em geral. Os espetáculos em si são as estrelas. Nada contra os artistas que fazem televisão. Nada! Ao contrário do que se diz, a maioria dos bons artistas que estão na telinha vem da tradição do teatro e nele permanecerão. Mas, por outro lado, ficou quase obrigatório se ter uma estrela com projeção na TV para se conseguir um patrocínio. Entender – patrocinadores e público – que bons espetáculos podem ser feitos por artistas que não tem seus rostos expostos a grande mídia é um avanço.

O gênero musical é hoje a vanguarda do processo de renovação da cena teatral carioca pela qualidade e o cuidado com a produção, e pela criatividade e profissionalismo dos artistas. Pela responsabilidade dos produtores, artistas e patrocinadores com seus projetos e com o que vão apresentar ao público. Pela renovação do público e dos próprios artistas.

Bom espetáculo, São Paulo!

Dudu Sandroni – Diretor, ator e coordenador da Pesquisa da Cadeia Produtiva do Teatro – Projeto EmCena

Manifesto da Associação de Grupos e Companhias de Teatro do Rio de Janeiro

Urge no Rio de Janeiro uma política pública voltada para a área teatral, que dê conta da diversidade artística aqui existente, diversidade esta que vigora nos dias de hoje devido à resistência de artistas que atuam sem apoio governamental e que vêm enfrentando cada vez mais dificuldades nos âmbitos da produção e circulação de espetáculos, da pesquisa de linguagem e da experimentação artística.

Urge no Rio de Janeiro a criação de editais culturais, assegurados por lei, a fim de viabilizar uma pluralidade de modos de produções artísticas, garantindo, desta forma, o estímulo do universo simbólico da população com projetos contínuos de Arte. Sabemos que países com uma história mais extensa investem em iniciativas de vanguarda e em pesquisas de linguagem continuadas como espaços fundamentais para o surgimento de novas realidades estéticas, por sua contribuição na criação de uma sociedade mais potente e mais preparada, que precisa de Arte para viver.

Urge no Rio de Janeiro a implementação de uma política efetiva de fomento à cultura, que além de necessitar de mais recursos, carece de direcionamento.

Urge no Rio de Janeiro a valorização em forma de editais públicos assegurados por lei do caminho “alternativo” de várias formas de produções artísticas cariocas – alternativo aqui usado no sentido de serem iniciativas artísticas entendidas como atividade econômica que se diferenciam no mercado por construírem caminhos próprios. São espetáculos, eventos, seminários, mostras, pesquisas e estudos que não se norteiam por modelos, ao contrário, constroem seu próprio universo poético à revelia de regras e da garantia de sucesso e visam, acima de tudo, estabelecer um espaço de interlocução com a sociedade através da experiência artística.  É o caso  do trabalho continuado de grupos e companhias teatrais, do movimento de novos dramaturgos cariocas, da pesquisa prática e teórica de artistas variados, entre outros possíveis modos de produção teatral. Destas iniciativas podem surgir novos sentidos e significados artísticos e estéticos que beneficiarão sem dúvida a sociedade, no sentido de promoverem uma movimentação de idéias e de práticas, estimulando, desta forma, simbolicamente a cidade como um pólo de identidade, de afeto e de inventividade.

Este manifesto vem firmar a importância da implementação de uma política pública, assegurada por lei, nas três instâncias do poder público – federal, estadual e municipal -, que atenda à diversidade dos modos de produção teatral.

Urge no Rio de Janeiro o fomento estável aos núcleos de experimentação cênica e de pesquisa de linguagem continuados. Para tal, é fundamental que haja um recorte na verba destinada à política cultural de todos os editais para grupos e companhias teatrais, coletivos cujos trabalhos se identificam com a continuidade, com o desenvolvimento de uma idéia ao longo do tempo, de acordo com demandas artísticas que, nem sempre, coincidem com as demandas que a comunicação de massas impõe. Também é importante que o critério de avaliação priorize projetos independentes que se identificam com o caráter de pesquisa em seus modos de produção, e que necessitam de fomento para sua atuação na cidade.

A classe teatral, através da União das Entidades Teatrais do Rio de Janeiro, vem dialogando com as três instâncias do poder público no intuito de conquistar para o Rio de Janeiro uma produção continuada de Artes Cênicas. Para tal, urge a criação de bases efetivas de uma política pública que assegure aos artistas e à população uma produção cultural vigorosa e continuada, cuja existência deva estar garantida independentemente dos governantes e dos partidos políticos que estejam no poder.

AGC – Associação de Grupos e Companhias de Teatro do Rio de Janeiro

Este manifesto é apoiado por:
Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e Juventude – CBTIJ
Centro de Pesquisa e Estudo do Teatro Infantil – CEPETIN
Associação Brasileira de Iluminação Cênica – ABRIC
Federação de Teatro Associativo do Estado do Rio de Janeiro – FETAERJ