Crítica publicada no Jornal do Commercio
por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 14.06.1997
O Príncipe dos Sete Mantos e a Princesa das Sete Rosas
O Príncipe dos Sete Mantos e a Princesa das Sete Rosas é um conto de fadas regado de cultura popular brasileira.
O texto de Fátima Café e Fernando Rebello conta a história de uma rainha que deseja ardentemente ter um filho nem que ele seja um lagarto. E se cumpre o destino.
Passado o tempo, o príncipe-lagarto dos sete mantos, desejoso de se casar, busca uma moça para ser a nova rainha, o que sua mãe desaprova, pois deseja continuar rainha e tudo faz para impedir o casamento. Mas, no final, o amor vence, e todos são felizes para sempre.
O conto de fadas exerce um fascínio não só nas crianças, mas nos criadores, seja de teatro ou de literatura. Inúmeras mil versões já se ouviu de inúmeros contos de fada. O conto encenado por Fátima Café é até bem contado; mesmo parecendo estranho que nesta história, quem realize o feitiço, seja a própria rainha – contra si mesmo e sobre seu filho. Lembra conceitos orientais do registro okãshico das palavras – lançadas ao ar, fica o registro e se cumpre o destino.
A rainha-mãe, misto de bruxa e madrasta, persegue a pretendente à mão de seu filho para impedi-Ia de se tornar rainha. Desta forma é contado o conto de fadas; onde arquétipos e situações arquetípicas dão lugar a situações menos ontológicas. Isto torna a história às vezes, um pouco confusa, não em seu desenvolvimento, mas na sua própria proposta.
Por outro lado, a encenação de Fátima Café recheia o conto de referências da cultura popular brasileira, fortemente sublinhado com os figurinos de Ricardo Venâncio, com referências ao Maracatu, Bumba-Meu-Boi e outras. A exteriorização excessiva do não-dito dos contos de fadas e o excesso de informações sobre a cultura popular brasileira, juntas, tomam, por vezes, pesado o espetáculo. Um teórico estudioso dos contos de fada, diz que não é necessário explicitar os contos de fadas, pois a criança tem uma orelha por detrás de sua orelha, o que a faz perceber, sutilmente as sutilezas dos contos de fadas.
A encenação de Fátima Café tenta uma linguagem contemporânea numa perigosa tentativa de emprestar contemporaneidade aos contos de fadas. Tem o rock do lagarto ao lado do Bumba meu Lagarto e do Maracatu do Encanto. Tudo isto ao lado de pesadas trilhas instrumentais originais de Carlos Eduardo Café que dão um tom por vezes muito forte ao espetáculo. E uma das características do conto de fadas é que as grandes tragédias são contadas de modo tão natural e simples que a criança aceita todos os contraditórios sentimentos humanos sem nenhum problema e absorve os ensinamentos embutidos nos contos. Ao se revestir estes acontecimentos de um tom mais trágico, dificulta-se a percepção do que está sendo dito por detrás do texto, criando-se uma barreira entre a criança e a história.
O cenário de Ricardo Venâncio lembra alguns conceitos e encenações dos anos 70; escadas em cenas fazem as de torres, castelo, e o que mais possa se imaginar, mas não formam um todo orgânico que criem um significado e ficam como grandes adereços em cena que na maior parte do tempo tapam a própria cena que muitas vezes se desenvolve atrás das escadas cenográficas.
O espetáculo tem excesso de informações – é um espetáculo de pesquisa – e isto se percebe em cena, o que talvez seja seu pecado capital. Mas se percebe também a busca de um trabalho sério, uma proposta, uma busca que merece ter continuidade, e que se despojado do excesso de adereços, em direção à simplicidade, pode trazer à encenadora, um excelente resultado.
Obs. Apresentada no Teatro Gláucio Gill.