Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 30.11.1996
A Surpresa é Isadora Ribeiro
Márcio Trigo, autor e diretor de O Pequeno Alquimista, em cartaz no Teatro Glória, é um desses raros profissionais bem-sucedidos na ampla área em que atua, entre ela: literatura, teatro, rádio e televisão. Seu programa radiofônico Ta na Hora de Dormir, embora dirigido a crianças, acabou ampliando a faixa etária de ouvintes pela qualidade da representação e pelas adaptações dos temas escolhidos. Além de suas histórias originais, como O Pequeno Alquimista, O Elixir da Longa Vida e A Verdadeira História dos Sapatinhos de Cristal, já publicados, Trigo, com muito sucesso, levou aos ouvintes, entre outros autores clássicos, Shakespeare (A Décima Segunda Noite) e Molière (Médico à Força), numa linguagem acessível e bem-humorada.
Com todos esses requisitos, sua adaptação de O Pequeno Alquimista para a cena era muito esperada. Porém, se no livro a história enxuta conta com o tom intimista proporcionado pela leitura, no palco a trama com personagens enxertados se estende além do necessário. João, o pequeno alquimista, filho de Aderbal e neto do Filofal, têm a missão de encontrar a fórmula que transforma metal em ouro. Na sua busca, ou melhor, no seu total desinteresse pela fórmula, vai mostrando ao pai, ao avô e aos demais sábios da A.A.A. (Associação Alternativa dos Alquimistas), outras invenções muito mais simples e interessantes, como: a bola e o jogo de futebol, os óculos, o guarda-chuva e até a prancha de surf ou o skate. Assim ele confirma que “as ideias geniais sempre são transformações do que há de mais simples”. Se esta afirmativa é o tema central do livro, na peça ela chega diluída por interferência de tramas paralelas criadas para sustentar o conflito da ação. A estratégia, no entanto, tem resultado pouco satisfatório. Além de empobrecer o enredo, prejudica a agilidade da encenação.
A grande surpresa do espetáculo está na participação da atriz Isadora Ribeiro. Caracterizada para um papel masculino, o mago Trimegistus, Isadora não só desglamouriza sua imagem, com maquiagem e adereços no figurino que não lhe deixam nenhum traço da cultuada beleza, mas interpreta seu mago mal humorado com toques de humor muito bem colocados. No personagem João, o menino Alan Pontes, tem especial naturalidade. O restante do elenco tem interpretações desiguais que não chegam a comprometer o resultado final do espetáculo.
Outra boa surpresa são os cenários e adereços cênicos de Claudia Alencar. Usando madeira e tecidos, Claudia constrói o laboratório do alquimista com detalhes interessantes, como a estante de livros e a mesa de inventos. Os adereços, sem nenhuma modernidade, têm o sabor das invenções exatamente como se imagina que deveriam ser: carruagem de controle remoto, bolas de futebol em tecido costurado e lentes de vidro amarradas para óculos. O Pequeno Alquimista é um espetáculo feito de detalhes e de alguns bons momentos. E estes agradam a plateia a que se destina.
Cotação: 2 estrelas (Bom)