Ciça Pugliese e Cláudio Caparica (de braços dados ao centro) vivem Dona Maria, a Louca e dom João

Crítica publicada no Jornal O Globo
Por Mànya Millen – Rio de Janeiro – 28.06.1996

Barra

O Passado a Limpo: peça cumpre sua proposta de conscientizar sem aborrecer com didatismos

Espetáculo para lavar a alma do Rio 

Ver o Rio transformado numa cidade pacífica, civilizada e limpa é desejo, ou deveria ser, de toda a população carioca e pode gerar muitas coisas. Em pelo menos dois habitantes da cidade maravilhosa, essa vontade gerou teatro. Dos bons. As ideias fervilhantes de Rogério Blat, que aliás não é carioca, para um Rio melhor encontraram perfeita tradução nas mãos do diretor Ernesto Piccolo. Juntos, eles já encenaram Funk-se, a deliciosa e empolgante Com o Rio na Barriga e agora a dupla volta com a corda toda em O Passado a Limpo.

Nesta aventura de época, com toques de ficção científica – o mocinho recebe a ajuda de amigos do futuro, que aparecerão na próxima peça dos dois, mas isso é uma outra história…- Blat e Picollo miram a sujeira que tomava conta da cidade na época em que dom João VI aportou por aqui. O ano é 1806 e Mariano, vivido com garra por Pedro Garcia, sobrinho do ator Edson Celulari, é um jovem que quer livrar o Rio do lixo jogado nas ruas pela população. Para isso, tenta inventar uma máquina de sugar detritos, mas acaba mesmo um “doido varrido”, de vassoura na mão, procurando conscientizar o povo, que prefere sombra, água fresca e pouco trabalho.

A cadência do texto, marcado pela linguagem acessível e pela mistura do humor moderno com referências e personagens históricos, cumpre sua função de conscientizar, sem lançar mão de didatismos chatérrimos. A plateia se diverte e quase não percebe que toma uma lição de moral ao ser lembrada dos erros do passado que hoje se repetem nas esquinas do Rio.

A história é simples, mas extremamente bem conduzida, ainda mais levando-se em conta que são 60 atores no palco. Tudo funciona como deve, dos figurinos de Kalma Murtinho à iluminação de Djalma Amaral; da música de Charles Kahn e Guilherme Hermolin à preparação corporal de Daniela Visco, as cenas são bem marcadas, e é evidente o prazer do elenco em estar no palco.

Henrique Vieira, como o pobre Abílio, e Leandro Santana como Maturabé, são outros que damos destaques na trupe.