Fotos: Renato Mangolin

Crítica publicada no Site da Revista Crescer
Por Dib Carneiro Neto – São Paulo – 30.10.2015

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Dois meninos diferentes, dois espetáculos imperdíveis

O Menino Que Brincava de Ser, em cartaz no Rio, e O Menino que Não Sabia Chorar, em SP, ensinam com delicadeza a arte de se viver com tolerância

 O Menino que Brincava de Ser

Nesta peça, em circulação desde 2007 em diversas temporadas e teatros variados no Rio de Janeiro, o tema é o bullying na escola, cuja vítima é um garoto gay. Quem estiver no Rio não pode perder a última semana no Teatro Cândido Mendes. Baseado em livro homônimo premiado de Georgina Martins, é um texto sensível, muito bem encenado, forte, humanista e ultranecessário no mundo de hoje, ainda tão intolerante. A Cia. Pandorga acertou em cheio ao fazer o trio de atores (Giuseppe Marin, Leo Campos e Tatiana Henrique) revezar nos mesmos papeis, seja de homem ou de mulher, de jovem ou velho, de adulto ou de criança. Afinal, isso demonstra e comprova ludicamente à plateia a tese do espetáculo: o combate ao preconceito, ou seja, todos nós temos várias faces. Isso funciona muito bem em cena, graças ao talento do elenco. O tema bullying tem sido muito explorado no teatro, mas aqui não há nenhum ranço de sermão, lição de moral, dedo em riste, nada disso. A delicadeza da abordagem chega a emocionar. E há ritmo, graça, humor, poesia, amor ao teatro.

Escolas deveriam sempre fazer filas imensas para levar seus alunos. Além de ensinar o respeito às diferenças, a peça é uma linda iniciação à arte teatral, porque mostra como se monta uma peça, como são os ensaios, as escolhas de figurino, as definições de papeis. Um grande achado.  Garanto que, como eu, você vai encher seus olhos de água quando, quase ao final da peça, o menino pedir à avó: “Vó, você me ajuda a conversar com meu pai e pedir pra ele gostar de mim do jeito que eu sou?” Eis, na minha opinião, a frase-síntese da peça, a chave mestra para uma vida de tolerância. Que esse espetáculo prossiga com mais temporadas, pois é teatro dos bons, de olho em um mundo melhor. “Aprendemos na prática que esta peça é para crianças e adultos”, destaca Cleiton Echeveste, diretor e autor da montagem. “Se a princípio parecia uma ousadia falar sobre liberdade e respeito à diversidade para os pequenos, em tempos de afronta a direitos civis básicos não é menos angustiante pensar que esses temas precisam, mais do que nunca, estar em pauta no teatro, na literatura e nas artes em geral”, conclui. Aplaudo de pé.

O Menino que não Sabia Chorar

E por falar em tolerância, grata surpresa em São Paulo é este texto da dramaturga Paula Autran que também mostra, de um jeito poético, extremamente sensível, como devemos aceitar as diferenças e aprender a lidar com elas. Conta a história real de um menino que nasceu com a chamada fissura labiopalatina e sem o canal lacrimal direito, ou seja, é uma criança de cujo rosto não escorrem lágrimas. A imagem poética, lindíssima, que a dramaturga escolheu para se referir a essa diferença é o grande lance desse espetáculo. Não conto aqui para não estragar o seu impacto, mas garanto que você e suas crianças vão se encantar.

A dramaturgia é inspirada nas ilustrações e textos de Luiza Pannunzio, mãe, na vida real, do menino Bento, que inspirou a peça. No elenco, Denis Antunes faz o menino protagonista, Camila dos Anjos brilha como a irmã em deliciosa interpretação e Fernando Fecchio desdobra-se em mais de um papel, sempre divertido, como o roqueiro Jimmy Joe, o cangaceiro Deoclécio Jerimum, o médico e o vovô Caruso (inspirado no ator Marcos Caruso, avô do Bento real, hoje com 3 anos de idade). A direção – precisa, objetiva e sem ansiedades – é de Fabio Brandi Torres. Destaque também para a trilha sonora original, a cargo do maestro Marcello Amalfi, executava ao vivo pelos atores, que tocam instrumentos como guitarra, sanfora, ukulele e até percussão corporal. “Essa história diz respeito a todos nós, pois não há ser humano perfeito”, declara a dramaturga Paula Autran. “A perfeição carrega em si o seu contrário, assim como toda vida traz em si o seu fim.” Lindo, não é? Para não perder.

Serviço

O Menino que Brincava de Ser

Teatro Cândido Mendes
Rua Joana Angélica, 63 – Ipanema, Rio de Janeiro
Tel. (21) 2523-3663
Sábados e domingos, às 17h
Ingressos: R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia)
Só até domingo (1º de novembro).

O Menino que não Sabia Chorar

TOP Teatro
Rua Rui Barbosa, 201, Bela Vista – São Paulo
Tel.: (11) 2309-4102
Sempre aos domingos, em duas sessões: às 12h e às 16h
Ingressos a R$ 10. Até 29 de novembro