Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 18.11.1998

 

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Na boa linha da chanchada

O Guarani, peça em cartaz no Teatro Rubens Corrêa, é uma das antigas paixões do diretor Cláudio Handrey. Ao contrário de qualquer estudante, de qualquer época, Cláudio se apaixonou pelo texto, ainda adolescente, quando foi obrigado a ler a obra na escola. Mesmo reconhecendo que em toda paixão vem a reboque um pouco de loucura, o diretor ampliou seu delírio juvenil e finalmente realizou seu sonho de encenar o texto de José de Alencar, autor que considera muito atual até os dias de hoje por tratar em sua obra de temas polêmicos como preconceito racial, inveja, moral e principalmente o amor. Não é por acaso que está em cena a paixão, não só a de Peri por Ceci, os protagonistas desta história, mas a do próprio Handrey pelo teatro de ator.

Cláudio Handrey, que vem do bem-sucedido espetáculo Porcos com Asas, onde mesmo com um elenco numeroso conseguia dar a peça um tom intimista, desta ousou mais ainda. Sob seu comando estão em cena 25 atores, que, sem muito espaço para improviso, seguem a risca a marca do diretor para o desenho da cena, na difícil tarefa de levar ao palco uma história cheia de tramas paralelas. Na cena do ator, se perde o espetáculo e isso é o melhor que poderia acontecer no palco. O contrário já foi feito em inúmeras montagens da ópera.

O texto de Angélica Lopes, mantendo o preciosismo de época, se mostra um pouco “duro” para alguns atores mais inexperientes. Em destaque no elenco, Esperança Mota em performance irrepreensível. O diretor trabalhou os tons graves da jovem atriz, que faz sua personagem em suave introspecção. Um achado. Regiana Antonini compõe seu tipo com humor muito próprio, grifando o texto com uma certa crítica que vai muito bem com sua personalidade cênica.

Ganhando todas as atenções da platéia, Emílio Orciolato Filho é a grande surpresa do espetáculo. O ator faz seu vilão sem nenhum estereótipo, suas cenas são de fino acabamento. Seu personagem usa nuances que valorizam o texto de forma poucas vezes vista. Um presente para qualquer autor e diretor. O restante dos intérpretes de personagens principais – Mateus Rocha, Samara Filippo, Isaac Bardavid, Sérgio Fonta e outros, realizam bem os seus papéis, mas o elenco de apoio se atrapalha nas grandes cenas de ação.

Os cenários de Dóris Rollemberg, um tanto desiguais, compões bem a floresta dos amantes, mas adereça demais a cena com praticáveis pesados e sem muitas funções. Os figurinos de Samuel Abrantes são preciosos, mas não têm a marca inventiva que caracteriza as outras produções do artista. A direção musical de Bruno Marques mistura trilhas cinematográficas de bom gosto, dando um ar contemporâneo à trama. Fechando a técnica Leysa Vidal, em grande forma, faz da sua iluminação um dos pontos altos da encenação.

O Guaranié um espetáculo grandioso pela forma, com todas as condições de conquistar a jovem platéia a que se destina.

Cotação: 2 estrelas (Bom)