Crítica publicada no Jornal Tribuna da Imprensa
Sem identificação de Jornalista, Rio de Janeiro, 09.09.1989
Micos e Dinossauros
Está no Benjamin Constant, nos fins de semana, uma oportunidade de entrar em contato com a dramaturgia infantil de Arnaldo Niskier. Textos escritos como literatura, há muito neles de pedagogo, desde a seleção dos argumentos até a visão do narrador: defende a ecologia, os animais em extinção e há sempre uma lição a ser assimilada pelo público infantil.
José Roberto Mendes vem-se especializando também em levar aos palcos os textos do autor: Saruê Astronauta, O Boto e o Raio de Sol, e agora O Dia em que o Mico-Leão Chorou. Não é tarefa difícil, já que os textos são de uma linearidade sem tropeços, com episódios que apenas intercalam sem rupturas o fluxo da narração. É aliás de uma eventualidade da ação que os títulos acidentalmente são escolhidos, eles não correspondem nunca aos argumentos centrais do autor.
A direção de José Roberto Mendes não tem logrado transpor em linguagem cênica os textos, alongando desnecessariamente a narrativa com cenas que não deslocam a ação e acabam deslocando o interesse do público. Já Andréa Dantas resolve melhor um texto mais árido como A Misteriosa Volta dos Dinossauros. Ela enxuga as sequências do livro (Nórdica, 1988) valorizando aspectos sentimentais e lúdicos da história. Pablo, o gato que é abandonado no original, pelo cientista, partiu para o país dos dinossauros, acompanha-o no entanto, pelo palco e vem a se constituir num pretexto bastante interessante para provocar o bom humor da história.
Aliás, Henrique Diaz consegue efetivamente fazer do gato mudo uma personagem vivaz. Isaac Bernat, também vestido por uma linguagem próxima da burla, imagem do “cientista maluco”, ganha a simpatia do público.
Aqui nesta peça a grande ajuda está nos bonecos de Fernando Sant’Ana com uma manipulação que se mostra inteira em algumas cenas e em outras é substituída por atores vestindo bonecos gigantes em solução interessante. Mas a fragilidade da espuma acaba comprometendo o visual de acabamento e nas cenas de sombra nem sempre a iluminação de Karl Lage e Robson Marques ficou tecnicamente bem resolvida. Merece um destaque especial a adaptação do texto de Ivan Zegz, que havia ilustrado o livro com Marcelo, e sua direção musical, além da composição: ele é o responsável pela qualidade do musical, uma qualidade que já não se repete no caso do Dia em que o Mico-Leão Chorou.
Preso ao cenário fixo e forte, o musical neste caso tem dificuldade de se compor com a narrativa já que as músicas interrompem – para alongar – as sequências. Apesar de bem ao gosto do autor, o humor também envereda pelo circunstancial na imitação de figuras do rádio e TV (Cauby, Chico Anísio, Paulo Francis, por exemplo) A figura antológica de Grande Otelo não chega a se destacar na pele do pajé, fazendo o estereótipo do bruxo, do mago e não repete o fascínio construído em Macunaíma, pelas mãos de M. Andrade e J.L. dos Santos.
Do ponto de vista técnico é bem superior a montagem dos dinossauros, cabendo aos micos uma mímica do texto sem ousar uma inovação capaz de justifica-lo cenicamente. De todo modo, como o tema da preservação da vida no planeta é bastante atual e questões como a dos botos, a dos micos-leões e a dos saruês sensibilizam as crianças que, contraditoriamente, inundam de chicletes as poltronas, de invólucros o chão. No mínimo se deduz que a preservação ambiental ainda está para além da cena…