Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 14.12.1996
Sem influência de Walt Disney
A ideia de transpor para o público infantil clássicos da literatura não é nova. O Corcunda de Notre Dame, de Victor Hugo, há pouquíssimo tempo produzido para as telas do cinema pelos estúdios Disney, ao contrário do que se possa pensar não torna fácil a tarefa de levar sua versão para o palco do teatro infantil. Mesmo que os personagens da trama já cheguem à plateia com uma certa familiaridade – fato que facilitaria a compreensão do enredo – as comparações com o filme são inevitáveis. A cruel concorrência, no entanto, não assustou o diretor e autor da adaptação para a cena, Paulo Afonso de Lima, em sua empreitada. Valorizando as características principais da obra, Paulo Afonso faz um espetáculo absolutamente teatral, sem moldura de cenários e truques de efeitos especiais que cheguem à frente da encenação.
O Corcunda de Notre Dame, em cartaz no Teatro Vanucci, já marca sua diferença tendo como personagem narrador o jovem Victor Hugo, como espectador privilegiado da trama que mais tarde iria escrever. No palco nu, tendo apenas como referência da ação uma miniatura da catedral de Notre Dame de Paris, o diretor arma sua história que ocorre simples para a plateia: o horrível Quasímodo aproveita o baile de máscaras que está acontecendo na cidade e sai às ruas para se misturar com o povo. A trama segue como era de se esperar, com os personagens mais conhecidos, entre eles o triângulo amoroso formado pela cigana esmeralda, o cigano Paolo e o juiz Phebo como vilão. O final feliz é garantido.
Mas se Paulo Afonso acerta em conduzir sua história dentro da simplicidade teatral, sua direção para atores deixa solto demais o elenco, que em muitos momentos aposta na caricatura exagerada dos personagens, em nome de uma comicidade desnecessária. Kiko Latanzzy compõe seu corcunda numa linha chachandesca incompreensível para o personagem. Mauro Gorini exagera nas cores do vilão, tirando qualquer outra possível nuance do papel. Cibele Larrama, convincente em sua cigana Esmeralda, tem bonita figura em cena. Os demais atores, Antônio Carlossouza (Paolo), Wagner Brandi (cigano Fredagundo), Gilson Gomes (cigano Giramundo), Paulo Rosken (saltimbanco) e Renata Castelli (mãe de Victor Hugo) cumprem suas funções corretamente na trama. Mas o melhor mesmo fica com o personagem Victor Hugo, criado pelo ator francês Olivier Clastre. Sem emoções estereotipadas, Oliver conduz o espetáculo atuando como narrador da história ou como jovem Hugo. Compondo bem os dois papéis, sua performance se destaca do restante do elenco pela simplicidade calculada que dá a interpretação.
O Corcunda de Notre Dame é uma oportuna montagem de um clássico para crianças que não vem a reboque do sucesso cinematográfico. Alguns exageros de interpretações ainda podem ser revistos para que a peça siga sua carreira teatral como imaginada pelo autor.
Cotação: 2 estrelas (Bom)