Conclusões

Ao chegarmos a essa parte da dissertação, reunimos as discussões presentes em sua totalidade e chegamos a algumas conclusões. Vemos esse trabalho como o início de reflexões que poderão ser continuadas por outros pesquisadores, enriquecendo ainda mais as questões das áreas de teatro para crianças e teatro-educação. Sem pretender ditar regras, até porque não tem o objetivo de dar uma “moral para a história”, essa dissertação possibilita uma ampliação das questões que são inerentes ao exercício de um teatro didático para crianças.

Podemos concluir que o teatro, como uma manifestação cultural, é educação não formal, mas, podendo assumir o papel da educação formal, como, por exemplo, quando é disciplina escolar. Contudo, o teatro enquanto espetáculo, independente de ser educação formal ou não, pode ter a intenção de educar, implicando uma construção da cena que entenda os processos educativos e que esteja voltada para alcançar esses objetivos.

Percebemos também que o espetáculo teatral pode ser um incentivador da pesquisa, possibilitando um olhar diferenciado sobre assuntos tratados dentro da escola, situação em que os alunos/espectadores podem estabelecer múltiplas e enriquecedoras leituras. Nessa posição, o teatro não se coloca como subserviente às práticas educacionais, mas ocupa um lugar de destaque e de parceria com a educação.

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais, o teatro é uma das áreas de conhecimento (disciplinas) desenvolvidas com o aluno no ensino fundamental. Nessa disciplina, o aluno aprende teatro por meio de três pilares: a criação da cena teatral, a apreciação de espetáculos e a contextualização do teatro ao longo da história. O PCN é enfático ao sugerir que o aluno deva ter possibilidades de apreciar espetáculos teatrais, bem como que é preciso criar condições para que isso seja garantido. E, nesse sentido, encontramos nos projetos institucionais um grande apoio para oferecer aos estudantes o acesso à linguagem teatral.

Os projetos de teatro para criança com intenções didáticas ligados a instituições podem ser experiências bem-sucedidas, no sentido de que desenvolvem os conhecimentos por elas produzidos e colaboram na educação e formação de seu público. Esses projetos conseguem ter grande alcance com seus espectadores, além de oferecer à criança um contato dinâmico e diferenciado com o espaço institucional.

Por outro lado, concluímos que o didatismo pode ser o termo mais preciso para definir o “mau didático” no teatro, associado ao conceito de uma pedagogia tradicional, que considera a criança um ser passivo em seu processo de aquisição de conhecimento. No didatismo, o teatro utiliza parâmetros tradicionais da escola para definir sua atuação, limitando-se à transmissão verborrágica de saberes a uma platéia passiva, em detrimento de todos os outros elementos que poderiam compor a cena didática teatral para crianças.

Percebemos que a experiência do teatro didático de Bertolt Brecht é uma boa referência para o desenvolvimento de produções teatrais, para crianças, com intenções didáticas. Brecht nos mostra o equilíbrio possível entre um espetáculo agradável ao público e suas questões. A cena brechtiana é divertida sem deixar de ser instigante e educativa, colocando a plateia numa prazerosa situação de reflexão.

O teatro com intenções didáticas encontra na linguagem épica um caminho para apresentar seus temas e abrir questões, que podem ser sugeridas pelo espetáculo, favorecendo a reflexão na fruição teatral. O teatro épico não dá respostas a seus espectadores, mas os estimula a refletir sobre e a buscar soluções para o que é problematizado pela cena teatral.

Também podemos constatar com a pesquisa que a diversão se faz presente nos espetáculos teatrais com intenções didáticas pelo fato de a investigação ser uma atividade estimulante e prazerosa. Sendo assim, a cena não precisa de aplicar com outros recursos para amenizar o “tom didático” ou usar elementos especiais para assegurar a diversão da plateia. A própria construção investigativa de um tema instigante para os espectadores torna-se diversão, em que se tem prazer e se aprende, simultaneamente.

Enfim, o teatro didático para crianças abrange três conceitos que influenciam diretamente seu entendimento: “criança”, “educação” e “teatro para crianças”. Então, se quisermos configurar um teatro didático de qualidade, devemos ter um bom entendimento de cada uma dessas terminologias.

Devemos entender que a criança é um ser complexo, sem clichês, preconceitos ou maniqueísmos, e a infância, uma fase com questões e interesses próprios, repletos de leituras e releituras do mundo, sendo latentes a curiosidade e o interesse pela descoberta. Podemos pensar que um espetáculo para crianças deva, em vez de dar respostas ou lições, instigar para a descoberta e para a proposta de questionamentos, mediante uma experiência prazerosa.

Desse modo, consideramos a educação de maneira ampla e abrangente, e que não deve nem pode ser exclusivamente responsabilidade da escola. Aprendemos pelo simples fato de viver em sociedade, devendo ser a escola a instituição que representa um meio de aprendizagem restrita e com objetivos específicos. Assim, o teatro pode ser, entre outras linguagens artísticas, um meio de educação sem se justificar ou substituir a escola, ou a ela se submeter.

O teatro para crianças deve respeitar o intelecto e o interesse próprios de seu público. Sendo assim, o “didatismo” (ou o mau-didático) estaria associado a uma tentativa de simplificar a função educativa do teatro, atrelando-o a ideias fixas, que não estão sujeitas à participação ativa de sua plateia. Já o bom-didático percebe que o entendimento do espetáculo por parte de sua plateia precisa ser uma condução feita por maneiras múltiplas que o teatro propicia, despertando diferentes graus de conhecimento em suas temáticas.

Assim, acreditamos que os objetivos didáticos podem ser associados ao teatro sem que este último se instrumentalize ou fique a seu dispor e que o teatro pode ser parceiro da educação numa fruição educativa. E, se os elementos principais do teatro didático para crianças forem respeitados – a criança enquanto ser autêntico, o teatro como arte autêntica e o conhecimento como algo amplo e instigante –, estaremos garantindo um espetáculo de qualidade, capaz de encantar, divertir e informar sua plateia, seja ela de crianças ou de adultos.

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