Matéria publicada no Jornal do Brasil, Caderno B, Capa
Por Joelle Rouchou – Rio de Janeiro – 14.01.1979
Numa peça infantil, as agruras de um Reizinho que não quer o poder
Uma historia é contada, desde ontem a tarde, ao publico infantil, através de sete torres, que servirão de base para a fantasia,a magia e os desejos dos pequenos. O Castelo das Sete Torres, de Benjamin Santos, estreou no Teatro Glaucio Gill, sob a direção de Luís Mendonça. No elenco, entre outros, Elke Maravilha, Ana Lucia Torre, Luís Carlos, Fernando Cezar e João Elias. O conto é simples, lembra as fábulas da carochinha, e começa com a coroação de um rei-menino que não aceita esse fardo imposto pelo falecimento do seu pai. Mas é obrigado a reinar, e tenta um Governo no qual possa conciliar o trabalho de monarca com a vida tranqüila e alegre de um menino sonhador.
A solução que encontra é a de aproveitar as horas de sono do palácio, e sobe a torre do castelo, para viver um mundo de imaginação e fantasia só seu. Nessas horas, cria um castelo de sete torres. Sete porque, num de seus passeios, estava muito triste e chorava deixando laguinhos de lágrimas em sete lugares pelos quais passava, e os lagos se transformaram em torres. Ele tenta encontrar uma saída para seu problema e escolher entre ficar no castelo ou tentar outro meio de vida.
Luís Mendonça dirige a peça com muita seriedade, pois acredita que o teatro infantil não tem ainda seu devido lugar.
Fazer teatro infantil é para mim uma obrigação ideológica. Existem poucas companhias com propostas sérias e construtivas. Há vários problemas a enfrentar, quando se quer montar uma peça infantil. De início, a verba para esse tipo de espetáculo é das mais baixas, os pais não procuram se informar sobre as peças que os filhos verão, procurando geralmente, a mais perto possível de suas casas. Acredito que agora está havendo uma mudança, está se formando uma consciência. A produção do Castelo das Sete Torres não foi baseada na palavra infantil, o que há de infantil nela é sua proposta.
O autor, Benjamin Santos, chegou ao Rio de sua terra, o Piauí, em 1969, e escreve peças a muito tempo. Em 1974, ganhou o segundo melhor lugar no concurso do Teatro Guaíra, e em 1977 ganhou o Mambembe para peças infantis. No momento, escreve a continuação desta peça, que provavelmente se chamará Do Outro Lado do Túnel. Enquanto isso Cecil Thiré ensaia seu O Fado e a Sina de Mateus e Catirina. Ainda este ano, o autor dirigirá o show do MPB-4 em São Paulo.
Acho que a peça está muito bem montada. E, mais importante, a idéia que eu quis passar foi captada e está sendo transmitida. O diretor entendeu logo o que eu queria, e fez um espetáculo muito bonito, que agrada não somente o público infantil, mais também aos mais velhos. Das 10 peças que escrevi, esta é a primeira montagem que não produzi.
A peça tem mais de 40 personagens, que mudam de roupa no palco e colocam figurinos feéricos feitos por Laerte Thome, que ajudam na atmosfera atemporal do contexto. Os atores cantam e dançam no palco, sob a direção de Caíque Botkay na parte musical, e as coreografias são de Rachel Levi. O trabalho dos dois foi feito em conjunto, usando técnicas de musicoterapia para aproximar o elenco da expressão musical e também da corporal. Caíque, que musicou o espetáculo, diz.:
A música para o teatro tem de refletir o que achamos, tem um papel crítico, é como um personagem. Comecei trabalhando com o teatro infantil e pude constatar que existem poucos diretores que vêem a importância da música. Ela não deve servir como plano de fundo, mais como boca da cena. O clima de trabalho para a relação do Castelo das Sete Torres, foi dos mais agradáveis, todos participaram da montagem, as idéias foram respeitadas, o que é algo notável, pois a maioria do elenco e da equipe de produção nunca trabalhara junto.
Preocupada com todas as marcações os momentos de entrada em cena, Rachel Levi conta os passos dos atores, verifica os gestos e tem uma opinião positiva da montagem.
O trabalho foi bom o texto ajudo bastante, na medida que propõe muito movimento, e é possível criar bastantes exercícios expressivos com os atores. O objetivo fundamental do teatro infantil é a possibilidade de oferecer às crianças a visualização de todas suas fantasias. A precisa do estímulo visual e auditivo para que a mensagem chegue até ela. Temos que conquistá-la através dos sentidos, trazer de volta os príncipes e as princesas dos contos infantis que alimentaram tantas gerações. Nossa preocupação maior não foi a de dizer algo às crianças.
A peça tem em seu papel principal Luís Carlos Niño, de 14 anos. Ele é o rei, que com a ajuda da avó (Elke Maravilha), vai procurar um mundo novo cheio de esperança. Luís Carlos já atuou em novelas de televisão como Te Contei e Pecado Capital, no teatro e no cinema. Mas prefere o teatro:
No entanto cada dia é uma coisa nova, e temos um contato direto com o público, o que não acontece na televisão, onde nunca sabemos se o público gosta ou não. Geralmente, as peças infantis são mais para jovens. O visual dela é bonito, acho que todos gostam.
O elenco é unânime em afirmar que o texto ajudou bastante “por ser inteligente e por tocar em vários pontos importantes”.
Ana Lúcia Torre faz sua estreia em teatro infantil, e se interessou pela experiência:
Na sua peça, todos os sonhos das crianças podem ser vistos com olhos novos, Não só pelo publico infantil, mais pelos mais adultos, que vão entender uma infinidade de temas que os preocupam, como a mãe castrada, que impele seu filho ao trono, malgrado sua vontade, e angústias existenciais de cada um no reizinho que procura uma válvula de escape.
Para João Elias, “o Castelo é a realização do sonho e abertura para a liberdade, chamando as crianças para o mundo onírico, debochando da nobreza. Acho importante manter vivo o sonho, então acabar com esse modo de fugir um pouco do dia-a-dia”.
Elke procura a magia para poder envolver a criança. Seu papel é de uma avó simpática, que ajuda o neto a solucionar seus problemas, sempre dando o maior apoio.
O tempo nesta peça não existe, assim como o aparato feérico. Existe uma discussão sobre a ganância do poder, como este corrompe, mas que talvez as crianças não se deixem enganar. Tenho certeza de que as crianças vão entender muita coisa, e que as imagens vão ficar na mente delas. É provável que não entendam alguns temas mais profundos, mas mais tarde certamente se lembrarão do que viram. E isto é muito válido, assim como é importante não deixar morrer a criança que existe dentro de nós.
Na peça, a flauta dá um tom renascentista, ao mesmo tempo que mostra músicas do folclore brasileiro. Várias alusões à atualidade são encenadas no espetáculo, um sonho.