Raul Barretto, que interpreta o palhaço Bricabraque do título: mestre na arte de improvisar, ele tira de letra as intervenções da jovem plateia

Crítica publicada em O Globo – Segundo Caderno
Por Marília Coelho Sampaio – Rio de Janeiro – 16.01.2005

 

Barra

O Bricabraque: Mesmo longa, peça dos Parlapatões tem ótima comunicação com público infantil

Interatividade para crianças

Fazer uma peça interativa para crianças pode ser um enorme risco, já que, mesmo sem o incentivo dos atores, elas costumam dar seus palpites durante a apresentação. Mas no caso do espetáculo O Bricabraque, do grupo paulista Parlapatões, em cartaz no Teatro do Jockey, essa interatividade, mui­to bem conduzida pelo ator Raul Barretto, acaba sendo a maior surpresa da montagem.

No começo da peça, o Bricabraque do título, um palhaço que vende bugigangas, está num mercado das pulgas conduzindo um leilão. E as crianças, que recebem um dinheiro de brincadeira na porta do teatro, o cabraquês, podem participar dos lances e levar alguma das “antiguidades” para casa. Essa primeira parte do espetáculo é, sem dúvida, a mais divertida para o público infantil.

Mas esse leilão não passa de uma introdução para que o ator comece a contar e, em alguns momentos, a vivenciar, a mirabolante história da peça. Tudo começa – ou pelo menos parece que começa – no momento em que o personagem vai ao cinema. Ali, onde também acontecem cenas muito divertidas com a participação do público, ele conhece a pulga Gala, com quem viverá uma série de confusões e por quem se apaixonará. Mas essa trama é apenas um discreto fio condutor do espetáculo, que será entremeado por situações sugeridas pelas próprias crianças. Como elas têm direito de participar, um mais levado pede histórias de vampiros, outra, menorzinha, de João e Maria, e o mais crescido, uma cena de beijo. Sendo assim, cada espetáculo, provavelmente, acoplará novas aventuras – o que não deixa de ser uma ideia muito interessante.

Menos 15 minutos fariam bem ao texto

Mas, na prática, é difícil unir o que está no roteiro com o que é sugerido pela plateia. Em alguns momentos, os cortes necessários para a inserção de novas ideias acabam provocando a quebra do ritmo do espetáculo. Na realidade, tudo funciona muito bem até os 35 minutos da montagem. Daí até o fim – ao todo, são 60 minutos – a peça começa a se arrastar. Talvez fosse uma boa solução enxugar o texto: este mesmo espetáculo, com cerca de 45 minutos de duração, poderia proporcionar às crianças momentos de intensa satisfação, sem espaço para a dispersão…

Quando se fala em palhaço, a primeira coisa que vem à mente é o circo e, consequentemente, suas cores vibrantes. Talvez por o cenário concebido pelo autor e diretor da peça, Hugo Possolo, e os elementos de cena, de Inês Sakay e Luís Rossi, em preto e branco, surpreendam de forma muito positiva. É tudo muito diferente do que estamos acostumados a ver nesse universo. As poucas cores da montagem são introduzidas com muita perspicácia pela iluminação de Marcos Loureiro e em alguns detalhes do figurino, também de Possolo. A trilha sonora de Paulo Soveral é muito eficiente, entrando nos momentos certos e imprimindo os ritmos adequados a cada cena.

No todo, O Bricabraque é uma montagem muito bem cuidada. E se forem feitas pequenas adaptações no roteiro, o espetáculo poderá ser muito bem recebido pelo público infantil.