Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 11.11.1978

Barra

Uma casa com rio dentro

Dois anos depois de ter realizado uma curta temporada no Rio voltou a cartaz, no Teatro Opinião, a peça, Não Tá Aqui, Não Tá Lá, Onde é Que Tá? criação coletiva do Grupo Auê. Num momento em que as pessoas se fecham dentro de exíguos apartamentos; num momento em que as crianças são quase prisioneiras dentro de suas próprias casas; e num momento em que as pessoas se fecham muito dentro de si mesmas, é positivo o surgimento de um texto que estimula o poder criador da plateia e mostra o início da transformação das coisas desagradáveis com o ato de cada um abrir as fechaduras de seu próprio peito. Num momento em que as pessoas habitam em “caixas de morar” é positivo o aparecimento de uma peça onde uma criança busca uma casa ideal, com rios passando dentro da sala de jantar, com cabides para guardar sonhos e gavetas para guardar beijos. E o mais positivo é a consciência de que essa é uma casa que “não se vê com o olho”, mas com a sensibilidade, com o coração.

Esse é o instante-chave, no espetáculo, que ainda não está bem solucionado. O final, significativo, chega a um tanto abruptamente, e parece-me que a criança não tem tempo suficiente para aprender o que está sendo proposto. Sei que o grupo também não está contente com o final da peça vem experimentando novas propostas da direção.

Não Tá Aqui, Não Tá Lá, Onde é Que Tá? é mais uma peça que vem engrossar o time de espetáculos que não têm grandes voos mas apresentam vários aspectos positivos que justificam levar as crianças. Essa, parece, é a tendência deste ano: nada excepcional aconteceu, mas aumentou o número de boas alternativas para os pais. O espetáculo dirigido por Michel Robin tem um clima simpático, gostoso. Na parte inicial, entretanto, a relação entre palco e plateia ainda está muito distante e poderia ser buscada uma maior comunicabilidade. A contribuição da música de Charles Kahn pode ser muito útil para isso. Bonita e agradável ela talvez pudesse envolver mais a plateia, sem ficar apenas “no palco”. A mesma observação pode ser feita para o elenco: os atores funcionam bem, mas estão representando num espaço muito fechado. É preciso “abrir” mais para a plateia a fim de que o público participe emocionalmente do que está acontecendo. Ainda mais sendo uma apresentação num teatro de arena não pode ser perdido o envolvimento da plateia. Há três melhorias evidentes nesta remontagem: a cenografia de Eleonora Drumond não é tão pesada e carregada (a direção, entretanto, ainda não compensou o efeito de “abertura” que havia com o cenário, no final da peça); o trabalho de interpretação de Mauri Aklander perdeu o tom tatibitate; e agora é o elenco que vai à plateia (anteriormente, as crianças subiam no palco e o elenco se perdia muito, prejudicando-se o desenvolvimento do espetáculo).

Não Tá Aqui, Não Tá Lá, Onde é Que Tá? estimula a fantasia e o sonho; mas não deixa que a criança acabe se desligando da realidade.