Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 02.08.1980
Fato ou fita
Não Sei se é Fato ou se é Fita, Não Sei se é Fita ou se é Fato, criação coletiva (texto e direção) do Grupo Travalíngua, em cartaz no Teatro Cacilda Becker, é um espetáculo bastante agradável e no qual, utilizando poucos recursos financeiros, seus criadores conseguiram obter um resultado bem satisfatório.
Há, em cena, um clima gostoso e jovial, uma atmosfera de brincadeiras infantis obtida, principalmente, através das músicas supervisadas por Sidney Matos, e das citações do texto. Existe, no palco, uma harmonia de elementos que criam um ambiente em que as pessoas se sentem bem relaxadas: o tom de interpretação, os figurinos criativos e alegres de Verônica, a bandinha ao vivo – tudo isso leva o elenco e a plateia a se transarem sem tensões, de modo mais solto, mais livre. Os cenários de Renata são expressivos. Mas, apenas quando existem. Explico: o bar de Zé Pretinho e a árvore das lagartixas são bons achados, mas acabam ficando muito isolados. A encenação sente necessidade de outros elementos cenográficos do mesmo nível. O grupo Trava língua obtém, ainda, bons resultados com os adereços com os adereços (a castanhola na ponta do cabo de vassoura para dar o som do galope do cavalo é uma solução excelente). Outro aspecto positivo do espetáculo é que existe uma boa dose de comicidade, mas com palhaçadas mais criativas e menos óbvias; não apenas esbarrões e correrias.
Em um determinado momento, o espetáculo cai bastante. É quando as crianças começam a mostrar visível desinteresse: É a parte entre a caminhada para a árvore das lagartixas e a descoberta do roubo das palavras. A direção coletiva não conseguiu solucionar bem e, inclusive, deixou de aproveitar a proposta do texto: a realização de uma caminhada cheia obstáculos. Cenicamente, os obstáculos são praticamente esvaziados.
No final, a festa com “as crianças em férias” consegue um ótimo fecho para a encenação, com brincadeiras gostosas e levando a uma boa participação, como a de imitar e a de descobrir (com música).
O que falta ao espetáculo – e é o que vem faltando à maioria das peças em cartaz – é um bom texto. Com alguns elementos de interesse, apesar de não muito originais, (como o capitão que troca as palavras), o texto (também coletivo) acaba não tendo muito sentido: cria-se uma preocupação com achegada do “Cref” e depois, como se os autores não soubessem como terminar, num passe de mágica tudo se resolve. Também não fica muito clara a história do roubo das palavras. Enfim, com o espetáculo permanecendo em cartaz depois das férias, os autores deverão substituir o “Cref” por alguma outra coisa. Poderiam aproveitar e dar uma “arrumada” no texto. No regular trabalho do elenco, vale um destaque para a atriz que faz o papel de “Zé Pretinho”.