Critica publicada no Diário Popular – Revista
Por Aguinaldo Ribeiro da Cunha – São Paulo – 26.11.1997
Espetáculo prima pela simplicidade
A obra de Bemiro Braga, autor e poeta mineiro, é a referência de Na Roça, definido pela produção do espetáculo (que está em cartaz no Teatro Arthur Azevedo) como um musical caipira.
Essa definição, sem dúvida, é acertada. Braga, nascido em 1872, morreu aos 65 anos de idade, em 1937, primou em seus trabalhos por retratar a vida do interior, da população rural de Minas Gerais e da Zona da Mata – muito semelhante à vida do interior paulista. Nessa adaptação de um de suas peças, além de manter-se o título original, conservou-se a história básica: uma família do interior, constituída pelo pai português, pela mãe brasileira e pela filha, apaixonada por um sitiante vizinho, a quem conheceu numa festa do arraial local. Tudo muito simples, ingênuo, mas bem próximo da realidade, da formação ética e cultural dessa população.
O autor foi contemporâneo de outro dramaturgo que tratou, também, desse tema, da vida na roça: Arthur Azevedo (por coincidência, nome do teatro onde está encenado). Os caipiras, seu jeito de falar, sua psicologia (um ser matreiro, esperto, avesso ao trabalho) já estavam construídos com grupo com características próprias já no século passado, durante os tempos do império.
A origem étnica é a descrita na peça: o português europeu e o brasileiro caboclo (descendente, talvez, dos antigos Bandeirantes). O português, imigrante, aqui enriquecido (trajetória repetida, depois, pelos outros imigrantes, italianos, japoneses, árabes). O brasileiro do interior, matuto, esperto, muito hábil em enganara os outros e falando daquele jeito muito próprio (trocando as letras, falando “ara” e não “ora”, “Ogênia” ao invés de “Eugênia”, o L pelo R). Essa é a visão que predominava na época de Braga e Azevedo e que influenciou depois escritores do porte de Braga e Azevedo e que influenciou depois escritores do porte de Monteiro Lobato (e seu inesquecível Jeca Tatu).
Um humor muito brasileiro, datado talvez no tempo, e nada parecido com o atual humor vulgar e grosseiro, que predomina em grande número de espetáculos, principalmente na televisão – mas também no teatro. O espetáculo, bem dirigido por Iacov Hillel, é agradável em seu simplicidade, em sua ingenuidade, com músicas que fazem parte do cancioneiro nacional – como Índia, Guacyra, Marvada Pinga, Vida Marvada, Beijinho Doce, Vao Torná Vortá, Minha Palhoça, Menino da Porteira. A simplicidade de conteúdo é contraposta pelo esmero com que a produção tratou da montagem bom cenário de Cecília Cerrotti e figurinos misturando o passado, a roça no inicio do século, com o moderno, o estilo country.
O elenco, todo ele muito bem, é formado por Wanderley Martins, Mirtes Mesquita, Ana Luísa Lacombe, Ivan Oliveira, Jorge Julião e Elza Gonçalves. Representam, tocam, dançam e cantam muito bem. A registrar, ainda a coreografia de Silvio Bittencourt e a direção musical de Wanderley Martins.