Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 14.01.1995
Musical frágil, mas ‘cult’
A septuagenária atriz Lana Turner inicia sua biografia perguntando ao leitor: “Quando uma mulher se torna uma lenda?” Num país onde a indústria da auto-estima é um lucrativo negócio, por certo a sentença não foi encarada como nenhum surto megalomaníaco. Lana é uma cult atriz. É claro que para uma minúscula platéia de cinéfilos, aficcionados por biografias trepidantes. O motivo não importa muito. Afinal o que faz, de uma peça, de um filme ou mesmo de uma loura burra, objeto de tanto interesse? Se a resposta for possível, é melhor começar a duvidar da legitimidade do cultuado. Na Cola do Sapateado, espetáculo do grupo Catsapá, nasceu cult em 1987 e permanece assim até hoje. Muito mais importante do que a frágil história, escrita a quatro mãos por Gisela Saldanha, Mabel Tude, Maria Dulce Saldanha e Tânia Nardini, que costura o espetáculo apenas como pretexto para a exibição dos números musicais, é o efeito que este provoca na platéia.
Numa escola anacrônica, seis meninas, de figurinos e comportamentos no mais puro estilosixteen, se preparam para enfrentar uma prova de geografia, para a qual não estão nem um pouco preparadas. Assim, provando mais uma vez que americano sabe tudo, mas brasileiro é espertinho, convencem a gringa Evelyn (Flávia Rinaldi) a passar as respostas no ritmo do sapateado. Num tour de force, a americana, que só entende de tap dance, tem que aprender em tempo recorde ritmos brasileiros, típicos de cada estado, para que todas possam acertar as respostas.
Se o roteiro aponta como certo o frevo para Pernambuco, o xaxado para o Ceará e o samba para o Rio de janeiro, perde a grande chance de brincar com a Jovem Guarda quando deixa para São Paulo a Bossa Nova. A direção de Tânia Nardini privilegia compreensivelmente a dança, mas tem no elenco resposta desigual na composição dos personagens. As exceções ficam com Maria Clara Gueiros, que faz a mal humoradíssima Mariana sem deixar cair o tipo, e com Tony Nardini, num personagem já naturalmente interessante. Este último, no entanto, se sai melhor quando não abusa de piadas locais, de referências particulares e familiares.
Na Cola do Sapateado, desafiando todas as leis da arte de representar,ou ponto por terra elaboradas teoria sobre a relação palco-platéia, é um acontecimento. E até que se prove o contrário, o teatro é feito para o público. Este comparece e adora.
Na Cola do Sapateado está em cartaz no teatro Ipanema, aos sábados e domingos, às 16h. Ingressos a R$ 7.
Cotação: 2 estrelas (Bom)