Crítica publicada no Jornal da Tarde
Por Clóvis Garcia – São Paulo – 23.11.1985
O Segredo: misturar as coisas
Morangos e Lunetas, uma montagem carioca que integra fantasia e realidade
Há uma certa diferença de estilo entre o teatro infantil que se faz no Rio e o paulista.
Aqui, ou as montagens são mais convencionais, com uma estrutura dramática definida, ou se passa para o extremo oposto, num espetáculo quase sem história, apoiado no lúdico, numa sucessão de jogos dramáticos. No Rio, e estamos naturalmente, falando dos melhores grupos, consegue-se uma mistura de um enredo condutor com uma encenação lúdica, criativa, num livre jogo cênico, a que não falta o humor carioca. Morango e Lunetas, montagem carioca que está no Teatro Maria Della Costa, se situa dentro dessas características.
A encenação se baseia num pequeno conto infantil de Denise e Beto Crispun, adaptado para o teatro pelos autores, o que garante uma estrutura ao espetáculo. A história é imaginosa, tendo como personagem central uma estrela, Tainá, que cansada da vida rotineira das estrelas, comendo ‘morangos’, aproveita uma carona com num raio e desce na terra, ou melhor, num navio, depois vai à praia, conhece a vida da cidade, o trabalho dos escritórios, trabalha numa boate, e encontra Pedro, um ”lunático” que espia as estrelas com sua luneta. Esboça-se um romance, mas continuam as aventuras. Tainá levando Pedro para conhecer o lugar das estrelas, o que acaba modificando sua rotina. A temática tem como ideia central as diferenças de cada um, pelo que cada pessoa deve escolher o seu caminho, o seu próprio lugar. “O segredo está em misturar as coisas”, diz o vendedor de mate e limão (figura característica das praias cariocas), dando a chave do tema.
Com uma história que integra a fantasia e a realidade, cheia de incidentes, Beto Crispun concebeu um espetáculo vivo, imaginativo, com muita movimentação, dando, mesmo, a impressão, tal a sua espontaneidade, de que está sendo improvisado, mas sem as imprecisões que esse tipo de montagem costuma ter. A solução para os cenários, já que as cenas exigem uma diversidade de lugares, foi feliz, com um espaço neutro, onde acessórios coloridos descem dos urdimentos ou são colocados pelos atores, resultando em belos efeitos visuais, com a contribuição da luz, os cenários de Gil Haguenauer e a iluminação de Maneco Quinderé. Os figurinos de Beto Crispun completam e se integram no visual.
Quem conhece Patrícia Pillar apenas pelo seu trabalho na novela Roque Santeiro, no papel da atriz Linda Bastos, que lhe dá pouca oportunidade, irá se surpreender com sua força interpretativa, sua comunicação, dando ao personagem Tainá uma energia explosiva. Mas todo elenco está ótimo, com Ednaldo Eiras revelando qualidades de dançarino, Débora Olivieri, uma excelente cômica na Severina, Solange Badim, especialmente na Carmelita, Beto Crispun, Luciana Sabino, Márcia Rubin e Guico Moraes