O elenco de Mitos, Mundos e Lendas mostra a interpretação do mundo através de várias referências

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 11.11.1995

 

Barra

Um caldeirão de culturas

Fátima Café e Alice Koenow são as mesmas autora e diretora de Fadas, Bruxas e Madrastas, espetáculo que reunia no palco as histórias de Alice no País das Maravilhas, Chapeuzinho Vermelho e Branca de Neve, contada pelas deusas gregas que tinham sob o seu poder as linhas da vida e da morte. O monólogo em que Fátima Café, como única atriz em cena, se multiplicava em diversos personagens, femininos e masculinos, revelava a plateia mais um interessante trabalho da dupla. Em Mitos, Mundos e Lendas, as lendas sobre a criação do mundo, como a formação do sistema solar, o povoamento da Terra pelos deuses, a conquista do fogo e o dilúvio são mostrados a partir do ponto de vista de várias culturas. Na história se fundem elementos da mitologia grega, da cultura indígena e da religião africana, todos em plena harmonia.

Cumprindo todas as etapas ritualistas propostas pelo texto, falta, porém à encenação uma certa leveza que por certo agilizaria seu ritmo. Muito mais pelas longas cenas criadas por Fátima Café, do que pela interferência de Alice Koënow em transpô-las para o palco, o espetáculo se apresenta desigual entremeando histórias curtas e enxutas, como a da criação do sistema solar, com outras longas além dos necessários, como a separação do céu e da terra.

Num cenário assinado por Edward Monteiro, repleto de símbolos que se remetem a fertilidade no mais amplo sentido, a direção de Alice Koënow procura, na medida do possível, cuidar bem, tanto da encenação como da performance dos atores. Seus esforços são plenamente compensados no que se refere à plasticidade cênica que o espetáculo alcança. Os figurinos, também de autoria da diretora em parceria com Valério Rodrigues, são atemporais e marcados por ícones das diversas culturas a que o texto se refere. A iluminação de Renato Machado sublinha poeticamente a ação.

O elenco, cumprindo corretamente seus papéis, tem em destaque a atuação de Isabella Bicalho. Interpretando uma menina de seis anos, que junto com o irmão (Cláudio Gabriel), um garoto de nove, procura abrigo na casa da avó para falar das suas tristezas pela separação dos pais. É a parte do enredo que introduz as lendas sobre a criação do mundo. A atriz foge da habitual caricatura de um adulto interpretando uma criança. Mais do que isso, imprime uma alegria natural aos demais personagens que representa, quebrando com gestual e movimentação coreográfica, o peso de algumas situações, que com sua interferência bem-humorada ganham novos contornos. Fátima Café, no entanto, carrega nas tintas e envelhece demais o personagem da avó.

Classificação 2 estrelas (Bom)