Crítica publicada no Jornal do Brasil 
Por Carlos Augusto Nazareth – Rio de Janeiro – 2004 

Barra

A Menor Orquestra do Mundo tem um início lento, com problemas, mas consegue, ao longo do caminho, ir vencendo suas dificuldades iniciais e termina conquistando a plateia, principalmente pelo empenho do elenco.

O argumento de A Menor Orquestra do Mundo é da Resistência Cia. de Theatro, porém, o texto é de Marcia Zanelato e conta a história de quatro soldados de um exército imaginário, que participam de uma missão de guerra. Eles não sabem que missão é esta. Caminham léguas, sem destino e em uma manhã, ao despertarem, descobrem que foram abandonados pelo resto da tropa.

Sozinhos, perdidos, sem rumo, sem saber o que fazer,  descobrem que um pesado baú, que carregavam todo o tempo, está cheio de instrumentos musicais. Isso muda tudo.

Lentamente vão criando coragem e começam a pegar os instrumentos e timidamente começam a tocar; a cada nota aprendida vão se sentindo mais felizes, a cada nota, cada vez mais livres e, assim, acabam  descobrindo sua verdadeira missão – a música – que há tanto tempo “carregavam” junto deles sem nada saber, sem sequer terem percebido.

Então abandonam o exército e saem, os quatro, pelo mundo, levando sua arte, em busca do prazer e da alegria de viver, fazendo o que gostam, o que descobriram gostar, o que escolheram fazer.

O texto, no entanto, diferentemente do argumento, claro e instigante, apresenta problemas no seu desenvolvimento; o espectador tem que ser conquistado nos dez primeiros minutos do espetáculo e, para que isto aconteça, ele precisa saber, neste tempo,  qual a história a que  vai assistir. No entanto, somente após trinta minutos o autor diz qual é o conflito central. É tempo em demasia.
O próprio texto denuncia isto, quando um dos personagens diz “estamos aqui há um tempão, falando e nada acontece”.

Tentando suprir esta falha, a direção de Camilo Pellegrini conduz o elenco a uma interpretação exagerada e a uma movimentação excessiva, o que leva os atores a criação de  personagens que caem no estereótipo e no clichê; a linguagem do clown, eleita pelo diretor, tem, como característica, ser ingênua, verdadeira, espontânea, em permanente troca com o público, o que, neste momento, não acontece.

Após a tomada de consciência pelo autor de que “nada acontece”, ele apresenta finalmente a trama central  e a história então se inicia; a estrutura narrativa vai corrigindo seu rumo, o  público começa entender o que se passa no palco, que conflitos acontecem, que transformações se fazem; surge em cena  uma interpretação mais verdadeira, mais natural e leve.

Dos quatro atores destacamos o humor de Daniela Fontan e a garra com que todos defendem seus personagens e o espetáculo.

Quando a música entra em cena, sob a competente direção de Leandro Muniz, executada pelos próprios atores, ela se torna, além de “personagem central”, um elemento importante  na aproximação entre a plateia e a peça teatral.

Ainda neste mesmo momento, os criativos e instigantes figurinos de Rodrigo Cohen entram também em cena para contribuir para o crescimento do espetáculo, provocando impacto visível no público, quando surgem, utilizados como o elemento cênico que transforma os quatro soldados em músicos.

Porém, figurinos tão interessantes não têm a sustentação necessária do cenário nem da luz. O cenário, também de Rodrigo Cohen, se confunde em cor e forma com os figurinos; além do que a luz de Ronaldo Oliveira, quase sempre a mesma, com poucos movimentos e efeitos, muitas vezes deixa a cena com iluminação insuficiente, dificultando até mesmo a visão do que acontece no palco.
A direção tem tarefa difícil quando  parte de um texto teatral com problemas de estrutura, mas ainda assim se mostra frágil em sua “orquestração”.  Os problemas de cenário e luz,  que não têm suas falhas originadas nos problemas de estrutura do texto, poderiam ter sido evitados. O desenho cênico e a movimentação – tão importantes para a estética do espetáculo, e  para a clareza da narrativa, não têm o cuidado que exigem.

Mas, ao final desta “guerra”, os atores, a despeito dos problemas, conseguem conquistar o público.

Acreditamos que estas questões possam ser corrigidas ainda nesta temporada, que apenas  se inicia, pois  a Resistência Cia. de Theatro, que, em 2001, montou o premiado musical infanto-juvenil Patativa do Assaré,  tem demonstrado buscar um teatro de qualidade.