Mouhamed Harfouch e Natan Rod: a intensa movimentação dos atores no palco é marcada por requebros do frevo, que enriquecem a texto

Critica publicada em O Globo, Rio Show
Por Mànya Millen – Rio de Janeiro – 02.03.2002Barra

A Menina que Perdeu o Gato enquanto Dançava Trevo na Terça-feira de Carnaval: Simplicidade vira trunfo

Muito humor com enredo mínimo

A brincadeira já começa no título, grande, do tipo que deixa o público com a pulga atrás da orelha, caraminholando sobre o conteúdo do espetáculo. A brincadeira é descobrir também que A Menina que Perdeu o Gato enquanto Dançava Trevo na Terça-feira de Carnaval, peça em cartaz no Teatro Sesi, resume-se em seu próprio título: é exatamente e somente a história de uma menina que perdeu o gato enquanto dançava frevo numa terça-feira de carnaval. Sem mais nem menos. Sendo que menos, nesse caso, é um dos trunfos da peça.

Com esse mínimo de enredo, mas esbanjando humor, cor e muita música, a Companhia Pop de Teatro Clássico consegue contagiar a plateia ao ritmo contagiante do frevo, tirando partido da simplicidade do texto (de Marcos Apolinário Santana) e procurando centrar forças no desempenho do elenco.

A história é perfeita para explorar as conhecidas figuras carnavalescas e do teatro popular: o palhaço, o homem fantasiado de alma penada, o guarda, a velha ranzinza… O espetáculo começa como um teatro de fantoches, onde o narrador, o palhaço Teme-treme (Geraldo Demezio), anuncia a história. Logo depois os atores em carne e osso começam a surgir de trás do grande tecido florido que serve como cenário para bonecos, dançando e trazendo na mão, em forma de fantoche-luva, seu próprio personagem.

Ao longo do espetáculo, atores e seus fantoches – que funcionam mais como uma gracinha cênica, sem nenhum demérito – dividem a cena. A direção de Demétrio Nicolau é segura e consegue equilibrar bem os dois pontos de narrativa.

Casamento coreográfico entre texto e atores

A preparação corporal de Nara Keiserman é, talvez, o grande e feliz destaque da peça: toda a intensa movimentação dos atores no palco é marcada pelos passos de frevo. Não há uma só palavra dita que não seja acompanhada por um requebro específico, gerando um divertido casamento coreográfico entre texto e atores que enriquecem graciosamente o roteiro.

Embalado por este intenso balé, o espetáculo vai mostrando a história de Maria (Cristina Furtado), a irrequieta dona de um gato (Natan Rod) que está doida para cair no frevo em Olinda e não tem com quem deixar o bichano.

Incentivada pelo amigo Patativa (Fábio Spinardi) outro folião inveterado, ela acaba levando o gato para a rua e aí a confusão começa… Para dançar, ela deixa o bichano com o amigo. Que para dançar, repassa o bicho a um palhaço (Alesio de Castro), que o repassa a um outro folião vestido de alma penada (Thales Coutinho), que o presenteia a um guarda (Mouhamed Harfouch), que por sua vez o despacha com uma velhinha ranzinza (Karla de Martins). Tudo acaba em pancadaria e gritaria, no melhor estilo pastelão do teatro de mamulengo.

Os bons atores exploram seus personagens no limite máximo da caricatura, abusando de caretas e trejeitos. Apesar de algumas cenas desnecessariamente esticadas, o conjunto funciona harmoniosamente.