Crítica publicada em O Globo
Por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 22.07.1978

Barra

Matuta: dúvidas que cansam

A encenação de Matuta, de M. Cena, no Teatro Dulcina, é um exemplo claro da distância que existe entre a intenção e a realização. Teorizando sobre seu trabalho o autor afirmou: “O texto, contando a história de uma busca de histórias, se apresentava como desafio. Nunca foi objetivo nosso simplesmente montar uma peça para a garotada. Buscamos uma concepção dramática que reflita nossa preocupação em contribuir para o surgimento de um teatro infantil mais polêmico. Temos plena consciência de que com isso corremos muitos riscos de cometer erros. Contudo, esse temor não conduz nem influencia nossa produção artística”.

O que me parece mais importante nisso tudo é a disposição de correr riscos na tentativa de encontrar uma concepção dramática que torne o teatro infantil mais vivo. Na prática, entretanto, isso está longe de ser percebido em Matuta. Se, depois da peça tão pouco comunicativa, as crianças saíssem com essa ideia na cabeça, haveria um saldo razoável. Mas, com o espetáculo dirigido por Marcondes Mesqueu, as ideias não ficam claras, e acaba-se perdendo totalmente o fio que poderia manter o diálogo entre palco e plateia.

A peça começa muito gostosa, com a comunicação sendo estabelecida através da música de Oswaldo Rosário, indiscutivelmente a melhor coisa da montagem. O elenco avança para o palco levado por uma batucada: há dança, canto, ritmo, comunicação. A seguir, os atores começam a fazer uma apresentação dos instrumentos musicais que, por ser demorada, começa a boicotar o bom envolvimento do público conseguido no início do espetáculo. A partir daí, a encenação não consegue mais retornar o pique inicial e o interesse despertado. Os personagens começam a procurar “uma história que ninguém saiba o final” e a dificuldade que encontram para descobrir o que querem é, na realidade, um espelho da dificuldade que o próprio espetáculo (incluindo o texto) encontra para dizer o que quer. A proposta é encenar a busca e os impasses que surgem. Entretanto, o que o grupo acaba passando para a plateia é o seu próprio impasse de querer dizer uma coisa (também não muito clara) e não saber como. E, na encenação do impasse, as coisas não evoluem, falta charme, falta ritmo, o interesse leva à monotonia, a monotonia leva ao cansaço. A reação dos personagens ao Espantalho, por exemplo, é a reação que o próprio público está sentindo: “O antigo já me fez ficar exasperado. E o senhor está me botando nervoso também”. A encenação, sem querer, consegue transformar a irritação dos personagens (irritados porque não conseguem achar uma história) numa irritação do próprio público.

Duas observações finais devem ser feitas. Primeiro, um elogio ao grupo pela sua disposição de fazer o espetáculo respeitando o pouquíssimo público que saiu de casa e foi até o teatro. (Notava-se, entretanto, um visível desânimo nos atores). Segundo, a disposição da direção em reformular a encenação, tentando resolver alguns dos problemas citados acima. Caso seja possível vencer a maratona de ver peças infantis nos fins de semana, voltarei à Matuta e reformularei a crítica se forem obtidas mudanças significativas no espetáculo.