Crítica publicada em O Globo – Segundo Caderno
Por Marília Coelho Sampaio – Rio de Janeiro – 25.07.2004
Marias do Brasil – A Nossa História Transformada em Fábula: Apesar das qualidades, peça é prejudicada por texto pouco claro
Uma viagem musical confusa à História do Brasil
Três fadas madrinhas são convidadas para abençoar um príncipe recém-nascido e, antes que a última dê o seu presente, uma bruxa lança uma maldição sobre ele. Providencialmente, a terceira fada usa sua varinha mágica para suavizar o tal feitiço e, junto com suas duas companheiras, foge com o bebê numa caravela que parte para as Índias. No musical infanto-juvenil Marias do Brasil – A Nossa História Transformada em Fábula, o público acompanha as aventuras desse menino que se chama João Grande, é filho dos reis portugueses João Bobo e Maria Louca, e que acaba aportando numa terra desconhecida que receberá o nome de Brasil.
No material de divulgação do espetáculo, Rodrigo Castilho, autor de Marias do Brasil em parceria com Marília de Toledo, deixa bem claro que “a peça é uma fábula baseada em fatos históricos e não a História do Brasil fielmente narrada”. Mas o público, que não tem acesso a esse tipo de informação, certamente ficará intrigado ao perceber que a maior parte da história gira em torno das desavenças entre as fadas boas e as bruxas malvadas, envolvendo a vida do príncipe. Só no fim do espetáculo surge o verdadeiro motivo da briga: a inveja que Maria Fedida sente de sua irmã, a rainha Maria Louca, por ela ter se casado com João Bobo e dado a ele o filho que ela não poderia – não se sabe por quê. E no meio das disputas entre as feiticeiras podem ser detectadas sutis referências à História do Brasil.
Texto tem muitos diálogos e pouca ação
Assim como não é fácil descrever a peça, também não é muito simples assistir. O texto, praticamente uma coletânea de cenas, tem muitos diálogos e pouca ação. E essa estrutura, que permanece a mesma em uma hora e meia de espetáculo, acaba cansando o público infantil. Para driblar as armadilhas do texto, o diretor do musical, Kleber Montanheiro, cria um espetáculo ágil e visualmente muito bonito.
Um dos pontos altos de Marias do Brasil é a música de Chico César, apoiada pela direção musical, pelos arranjos e a pela trilha incidental de Fernando Barba. Talvez passe despercebido para o público, e vale a pena observar, o recurso de uma sonoridade distinta para cada lugar: quando a cena se passa em Portugal, os músicos tocam alfaias, violões e sax alto, numa referência à família real; na África, destaca-se o berimbau e no Brasil, os instrumentos são substituídos pela percussão corporal – o que as crianças adoram.
Também são muito felizes os adereços, os figurinos, a iluminação e o cenário de Kleber Montanheiro. Esse último, um tablado de madeira, que, manuseado pelos próprios atores vai se transformando em diferentes espaços durante a peça. Um dos mais belos é o da caravela que veleja durante a noite, escoltada pela lua cheia.
Espetáculo precisa de alguns cortes e ajustes
Também estão sintonizadas com a proposta da direção as coreografias de Paulo Goulart Filho e a preparação vocal (Adilson Rodrigues. No elenco formado por 12 atores, sobre saem Daniela Cury (Maria Escandalosa), Juliana Bógus (Maria Fedida), Nábia Villela (Maria Mole) e Silmara Deon (Maria Fumaça).
Apesar de ser um espetáculo que reúne uma série de qualidades, Marias do Brasil precisaria de alguns cortes e ajustes no texto para que pudesse estabelecer um contato mais próximo com o público infantil.