Crítica publicada em O Globo
por Clovis Levi – Rio de Janeiro – 01/09/1979
Gente Fina é Outra Coisa
Vendo anos seguidos os espetáculos infantis mostrados no Rio de Janeiro fica cada vez mais clara a conclusão de que a maior dificuldade existente para os grupos é a falta de uma dramaturgia de qualidade e em boa quantidade. Em recente entrevista ao O Globo, Lupe Gigliotti e Cininha de Paula, autoras de Maria Gente Fina, em cartaz no Teatro Vanucci, declararam que depois de procurarem autores e novos textos chegaram à conclusão de que não havia nenhum que valesse a pena investir, até que surgiu a ideia: por que não escrever?
Infelizmente a intenção das autoras frustrou-se na hora da realização. O texto de Maria Gente Fina, escrito, segundo as autoras, porque não conseguiram encontrar uma dramaturgia de qualidade, acaba não acrescentando nada à essa tão pobre dramaturgia infantil. O resultado final de toda a encenação acaba sendo bastante fraco porque está todo baseado numa fonte de pouca sustentação, que é o texto. E isso apesar de a montagem contar com o envolvimento de artistas que já demonstraram eficácia e criatividade em trabalhos anteriores como Wolf Maya (direção), Ubirajara Cabral (música) e Kalma Murtinho (cenários e figurinos). Entretanto o estímulo partido do texto é tão pouco motivador que o resultado do trabalho desses três artistas citados é bastante inferior ao que vêm apresentando. Quando a matéria-prima é falha dificilmente se consegue obter um produto de boa qualidade.
Para a plateia a peça divide-se em duas partes bem marcantes: antes e depois do rapto. Na primeira, o desinteresse é total. A trama não evolui, os números musicais, que já não têm grande força, ainda acabam prejudicados pelos atores fingindo que cantam. Até aí, os únicos focos de interesse são as intervenções de Vera Joppert como Helga Helmut Hellmans e de Cininha de Paula como Maria Gente Fina. Depois do rapto, a carpintaria teatral se torna mais eficaz e tanto o texto como o espetáculo desenvolvem-se melhor, apesar de continuarem sem qualquer brilho. Surgem aí mais dois trabalhos de interpretação que merecem citação: Levy Cerkes como Roy Massachussets e Germano Filho como Detetive DDT Instantâneo.
A peça mostra pessoas que falam sozinhas; personagens que se escondem e descobrem os mistérios da trama; um jogo com nomes de ruas sem qualquer interesse para a criançada, que passa um tempão sem saber do que os atores estão falando; e há até incoerências: como o nome de Helga poderia constar da carta se sua presença (de Helga) é totalmente inesperada?
Wolf Maya, que nos mostrou criativos espetáculos como Os Cigarras e Os Formigas e Maroquinhas Fru-Fru, onde era possível perceber um toque muito pessoal do encenador, mostra em Maria Gente Fina um trabalho sem vida, sem clima, sem alegria. Até o lugar-comum do esbarrão de costas foi utilizado. Só espero que não seja ideia da direção colocar aquela claque irritante que fica puxando palmas ao fim de cada número musical.